quarta-feira, 27 de maio de 2009

Etty Fraser

Etty Fraser é uma das atrizes mais carismáticas da dramaturgia brasileira.

Fale sobre o seu trabalho com curtas, você que fez um monte de curtas...
Pois é, depois que eu fiz o filme “Durval Discos” principalmente, ai começou a surgir muito convite, o pessoal pedindo para fazer curtas, pessoal de faculdade, de escolas e eu nunca soube dizer não, fiquei virgem até os 30 anos não sei como, porque nunca soube dizer não. Então dos vários que eu fiz eu achava muito gostoso o contato com os jovens ... fazendo com vontade, porque tudo que a gente faz na vida tem que ter vontade, porque de uma certa maneira eu estava ajudando esse pessoal jovem a fazer os curtas, eu achei muito gostoso, todos os que eu fiz eu achei muito gostoso de fazer, por que eu achei uma coisa muito proveitosa para mim também, não no ponto de vista financeiro, claro, vocês sabem. Mas do ponto de vista de prazer foi muito gostoso, muito prazeroso.

Você que trabalha com teatro, com TV, qual é o grande barato de fazer um curta, como é a sua preparação, o que te leva a fazer um curta?
Preparação... eu leio, claro, quando me mandam o curta, assim vejo se é uma coisa interessante, porque eu estou numa certa idade, faço 78 anos, faço agora, porque eu estou numa idade que eu não quero fazer coisas que me façam mal, compreende? A pouco tempo me ofereceram um curta que eu me neguei a fazer, porque era uma velha muito, que a que eu faço na peça, eu faço uma velhinha com Alzheimer, na última novela eu fazia uma velhinha esclerosada, por que nessa idade não dá mais para fazer a Julieta do Romeu, ou é esclerosada ou é com Alzheimer, mas essa aqui era uma velhinha que estava morrendo e por cima era com ela, e eu pedi muitas desculpas para pessoa que me convidou para fazer, mas eu falei “eu sinto muito”, e ele disse “não mas eu fiz pensando em você, se não fosse você não podia fazer”, mas eu falei “eu sinto muito” , mas não me dá prazer, tem que ser alguma coisa que me dê prazer e me dê uma satisfação de fazer o curta.

Para ter a satisfação de fazer um curta, a atriz tem também que ter a satisfação que o curta seja visto por bastante pessoas, e o curta é bem restrito, poucas pessoas tem acesso, as vezes até poucas pessoas sabem que você fez um curta, isso de certa forma não chateia na hora de aceitar um convite ou é mais pela experiência em trabalhar, fazer alguma coisa diferente?
Mais pela experiência em trabalhar e fazer alguma coisa diferente, porque nessa altura dos acontecimentos, em 48 anos de carreira você não está mais em apareceu, se não apareceu se deixou de aparecer, claro que é muito gostoso de saber que o negócio é um grande sucesso, mas é mais mesmo uma ajuda que eu estou fazendo eu acho, é alguma coisa que me dê prazer e ao mesmo tempo uma ajuda para pessoas que estão fazendo.

Os grandes cineastas começam com o curta, e acabam abandonando o curta quando tem um sucesso e as atrizes tem a grande chance de fazer alguma coisa diferente fora dos padrões de teatro e da televisão.
Eu vou dar um exemplo muito interessante: a mais ou menos uns sete, oito anos atrás a Muylaert me convidou para fazer Kiki em ‘Como nascem os Bebês’, como nascem os bebês de acordo com Kiki, era um curta que ela fez, muito engraçadinho, era uma menininha que vai explicar na sala de aula como nascem os bebês, então ela entendeu tudo errado, claro né, e eu fiz um papel de uma diretora de escola que dizia 3 frases, aí quando terminou o curta a Anna falou; “Ai você vai me desculpar que era tão curtinha, mas eu te prometo que o dia que eu tiver um filme grande você vai ter um papel ótimo”. E foi aí que eu fiz “Durval Discos”. Quer dizer, vai ganhando né. Então para mim “Durval Discos” foi um marco para mim, eu não fiz muita coisa em cinema, porque estamos mais aqui em São Paulo do que no Rio de Janeiro, e o cinema acontece mais no Rio de Janeiro, mas eu não fiz coisa muito boa de cinema, mas essa filme eu adorei fazer, e foi por causa de um curta que eu tinha feito.

Você acha que dá para contar uma história em pouco tempo de metragem?
Dá, conforme a maneira em que ela é contada dá. Eu fiz um não sei se era a São Carlos ou da FAAP, era o “Apartamento 21”, eles vão ficar bravos comigo que eu não me lembro, mas era muito interessante eu achei, contava uma história rapidinha e bem contadinha, gostei muito desse curta que eu fiz. Eu acho que dá, se o curta é bem feito, eu gosto de assistir curta também, eu gosto, eu curto.

Quais os curtas que você fez e que gostou e quais não foram legais?
Eu gostei muito desse “Apartamento 21”, eu gostei muito desse outro, não teve nenhum que eu não achei legal, todos eu achei muito legal, o pessoal... não teve nenhum que eu tivesse... aliás se você me perguntar qual é o nome de uma peça de teatro que eu não tenha gostado de fazer eu não saberia te dizer. E a mesma coisa com novela, eu curti muito fazer peça, e o curta também, as coisas que eu fiz eu curto de fazer.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

André Ristum

André Ristum é diretor do premiado curta ‘Homem Voa?’

Fale do seu trabalho com o curta-metragem.
Faço curta desde 1997, meu primeiro curta foi ‘Pobres por um dia’, depois eu fiz em 2001 ‘Homem Voa?’, que foi feito com produção e patrocínio direto, eu fiz ‘De Glauber a Jirges’ em 2005 e agora em 2006 o ‘14 Bis’ esse é totalmente captação de Lei Rouanet esses curtas, na verdade, eles já são uma coleção bacana porque você tem um pouco de tudo, o primeiro curta é uma história tradicional, clássica, ficcional em termos de ser uma produção normal, e a forma inclusive de filmar e captação é tudo muito clássico também, muito movimento de câmera... é um orçamento razoável para a época, como eu falei, em 97, custou 80 mil reais, na época era 1 para 1, então, 80 mil dólares, então com um orçamento razoável, foram 10 dias de filmagem, tinha um elenco bacana e foi todo filmado em Ribeirão Preto. Então isso é uma produção média-grande para um curta e bem mais clássica.

‘Homem Voa?’ também estrutura clássica, é um docudrama, uma mistura documentário ficção, é super pequeno, produção, foram 2 dias de filmagem, custou 45 mil reais, também foi filmado em Ribeirão Preto, então enfim, o que muda do ‘Homem Voa?’ comparado com o ‘Pobres por um dia’ é o tamanho da produção, mas os dois foram rodados em 35mm, estou te dando um monte de informação, assim você aproveita como quiser. O terceiro curta já é uma linha totalmente experimental, é baseado nas cartas do Glauber, então é uma coisa assim nessa onda, as ‘Cartas’ é um texto bem poético, e o filme tenta ir nessa linha também, um experimental poético, de fazer uma viagem ai em cima das cartas, todo captado em super 16 e super 8, mistura também material de arquivo, super 8, e ai depois para 35, enfim, para poder circular, festival e tal, e o que é bacana é que você mistura todos os formatos ali e é totalmente outra linha, não tem nada a ver com ‘Pobres por um dia’ e ‘Homem Voa?’, e ai o ultimo, ‘14 bis’ também rodado em super 16, só que assim, a maior produção das 4, mais de 500 mil reais de orçamento em captação, elenco grande, que une esse estilo clássico de produção do ‘Pobres por um dia’ e do ‘Homem Voa?’, só que ele trás uma coisa bem mais ousada na câmera, câmera solta, câmera na mão. Esse é um apanhado geral sobre os 4.

Os cineastas, principalmente quem faz curtas, quando tem uma boa repercussão na mídia, acaba migrando para o longa. O curta acaba sendo um pouco marginalizado pelos próprios cineastas. A que você acha que deve isso?
Na verdade assim, não que eu enxergue o curta como um passo, uma etapa, mas é que o curta comercialmente não representa muita coisa comparado com o longa. Mas eu não acho que em todos os casos é assim, eu mesmo, meu terceiro documentário é um documentário de longa, não era um longa de ficção era um documentário longo que tem influência dos outros 3 curtas e meu próximo projeto é uma ficção e eu não descarto a possibilidade de fazer curta ainda, é que eu não tenho um grande curta agora. Normalmente o curta é ousado mesmo, é uma etapa da carreira e tal, mas não necessariamente isso acontece com todo mundo. Mas assim, para responder sua pergunta, por quê? Porque o curta é considerado uma etapa , mas eu olho para o curta e olho para o longa como um conto e um romance, o curta, você pode continuar fazendo o curta porque é um outro formato, outro tipo, você conta uma história breve, e até ontem eu estava falando disso com um amigo e o curta eu acredito que comercialmente agora ele vai ter um interesse maior por conta dessas mídias de celulares e essas coisas mais rápidas e portáteis porque daqui a pouco o pessoal vai poder baixar um curta no percurso do ônibus, no percurso do trem, no percurso do metro, vai assistir um curta , 20 minutos, 25 minutos, acabou o percurso acabou o filme está tudo certo, então é um formato que passa a ser interessante até para esse tipo de utilização.

E agora com essas mídias que pode baixar e também gravar, está tendo uma avalanche de filmes, curtas e tudo mais, sem muita preocupação com a estética, com a linguagem, com o roteiro e tudo mais. O que você acha que, uma pessoa que quer fazer um curta ela precisa fazer um trabalho para destoar dessa avalanche de curtas e vídeos que tem por ai?
Então, na minha época, parece papo de velho, mas na minha época em que eu comecei a fazer curta era bem diferente de hoje, há 10 anos atrás você não tinha essa volume de produção gigantesco que nem hoje. A qualidade da captação digital e trânsito para e película e tal, ou não, realmente acaba trazendo uma avalanche de produtos e você vê que existe uma grande vontade de estar realizando, de estar fazendo, mas que muitas vezes falta um conteúdo aquilo que está sendo produzido e o que acontece é que nessa produção tão grande tem muitos curtas que são rodados e gasto dinheiro até do bolso das pessoas e acaba não sendo exibido em nenhum lugar, não entra em nenhum festival, porque tem uma concorrência muito grande, então eu acho que antes de realizar um curta, antes de realizar qualquer filme, o importante é focar no conteúdo, na idéia, aquilo que você está contando antes de qualquer coisa, antes de exercício de estilo, antes de qualquer coisa focar no conteúdo. Tem que ter uma boa história, coisa consistente, bacana, rica, acho que é a melhor maneira de se diferenciar.

O curta tem um poder de síntese muito grande, você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de metragem?
Essa é a capacidade do curta, No outro dia estava falando com um cara que tem um site na internet e ele está montando esse site, é o Itarine que mora nos Estados Unidos, e ele está montando esse site e ele coloca tudo, curta, documentário, longa e etc. E ele estava falando do apreço que ele tem pelo curta, porque que ele gosta de curta, e ele não tem paciência para longa, não tem saco de estar 2 horas envolvido na história até acabar. Essa é a grande vantagem do curta, ele consegue te contar uma história em 15 minutos, eu acho que consegue, nem todo mundo consegue, as vezes você vê umas coisas confusas que a pessoa não conseguiu nem contar uma história ali, mas o curta é justamente isso, é a possibilidade de contar uma historia num breve espaço de tempo, você construiu um pequeno vácuo temporal e contar uma história, mas é um formato diferente, não é pegar o arco, narrativa do longa e reduzir ele, colocar na máquina de lavar roupa de secar e fazer ele encolher, é outro formato, outro estilo, outro tipo, outra coisa.

O curta tem, além de pouco espaço na mídia para divulgar o trabalho e tudo mais, ele é pouco assistido, só em festivais ou alguns canais fechados, a própria TV Cultura que tem um espaço para isso, e a pessoa que faz um trabalho quer que seja visto por um monte de gente, o trabalho seja divulgado. Esse você acha que é um grande empecilho para uma pessoa fazer um curta, para que a pessoa tenha vontade de fazer um curta?
Não sei se isso vai afetar a vontade, por que essa coisa da vontade a pessoa quer fazer de qualquer jeito, então faz, nem que seja para mostrar para os parentes só, acho que tem que fuçar, tem que ir atrás, tem que lutar. Imagina, o ‘Homem Voa?’ é um curta, foi exibido em televisão, foi exibido nos aviões da TAM teve em mais de 25 festivais no Brasil e no mundo, foi lançado, tinha lançamento com 10 cópias dele e seria exibido no Cinemark, foram 10 salas foi visto, com essas 10 cópias, foram 160 mil pessoas, para um curta. Então, assim não é formato aonde existe um circuito clássico, fácil para você entrar, não é. Agora tem que inventar moda, agente conseguiu isso com o ‘Homem Voa?’, e o ‘14 bis’ agora fizemos outro case de invenção, enfim, de sucesso, alem de ter exibido na televisão, além de festivais, alem de estar em cartaz na terceira semana no Cinemark, hoje no Cinemark Santa Cruz, uma cópia só, porque, enfim, questão de orçamento e não podia fazer mais que 1 cópia e foi lançado em DVD, e está em DVD, está sendo vendido em DVD em todo o Brasil mais de 3, 4 mil cópias de DVD vendidas, e como é que agente fez? A gente juntou botou 14 bis junto com ‘Homem Voa?’ Making-off de um e de outro enfim, fez um volume razoável para o DVD e uma distribuidora viu, assistiu, gostou e topou fazer, e está aí, distribuiu para o Brasil todo, e se a 10 anos atrás você me perguntasse você acha que você vai distribuir seus curtas em DVD pelo Brasil todo, via fazer lançamento, vai botar na salas? Eu ia falar imagina, você está louco, mas você fuça você consegue aos poucos encontrar os caminhos, eu acho que é isso que o cara que faz o curta tem que fazer, tem que fazer porque a vontade de fazer tal de mostrar o trabalho.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Jorge Bodanzky

Jorge Bodanzky é diretor do cultuado ‘Iracema, uma transa Amazônica’, um dos 16 da carreira do diretor, é pioneiro no casamento da ficção com o documentário.

Fale sobre a sua experiência com curtas, você que é mais conhecido como diretor de longas.
Olha, todo mundo começa com curtas, eu comecei como fotógrafo, como câmera e quando realizei meu primeiro trabalho como direção junto com o cineasta Hermano Penna, na realidade não é bem um curta, é media-metragem, o filme tem 40 minutos, chamado “Valderis” uma experiência que a gente fez em Brasília ainda no início dos anos 70, era o auge da ditadura militar, e a gente pegou o personagem, uma moça chamada Valderis, que existia de verdade, e que ela sublimava essa impossibilidade de atuar politicamente com a religião, com as religiões místicas, Brasília sempre foi um grande ponto de misticismo do Brasil, e ela então freqüentava cartomantes, terreiro de umbanda e várias coisas, mas no fundo era uma fuga por não conseguir realizar como adentro de um universo político. Então sofria de perseguições, essas perseguições que eram reais da polícia se misturavam com perseguições criadas e coisas assim, então foi uma experiência docudrama, que é um filme mais experimental, trabalhei muitos anos junto com meu ex-sócio alemão Vemoniqui para um instituto que produzia filmes didáticos para o governo alemão e esses vagavam muito, grande parte eram 20 minutos, 15 minutos, alguns mais longos, mas eles tinham propósito didático apesar de serem filmes que eram autorais, com tema que agora vem sendo muito procurado, varias pessoas pedem esse filme para mim, que é a comparação de um operário da Volkswagen na Alemanha e no Brasil, mas isso ainda nos anos 70, quando as duas empresas, tanto a alemã quanto a brasileira produziam fusca, então a gente pegou um operário que fazia absolutamente a mesma coisa no Brasil e na Alemanha e comparou a vida dos dois, para mostrar, um filme didático, para estudantes, mostrar o que é um país de terceiro mundo e um país de primeiro mundo aonde estão as diferenças, porque que um operário que faz a mesma coisa vive de maneira tão diferente no primeiro e no terceiro mundo, outros eram estudos de comportamento de crianças na sala de aula, enfim, tinha uma preocupação didática para esses instituto que fornecia isso para as escolas alemãs.
Teve uma outra experiência interessante em curta-metragem que eu fiz para a televisão francesa chamado ‘Lês admire’, que são os iluminados, os loucos sobre os surfistas de trem, um filme feito no início dos anos 90-, era moda no Rio de Janeiro surfar o trem, uma loucura total, hoje eu não faria mais isso, entreguei uma câmera video8 para um desses rapazes surfistas, ensinei a ele a mexer na câmera e eles se filmaram em cima do trem, depois eu acompanhei um pouco o dia-a-dia desse rapaz, que era um camelô no Rio de Janeiro, subúrbio em todos os lados então eles usavam o surf no trem como meio de transporte diário deles. Esse filme fez um sucesso muito grande, chama-se Surfista de trem, é um filme de 22 minutos também feito em video8. Eu sempre gostei de experimentar e usar as tecnologias mais leves porque eu trabalho quase sempre com câmera na mão, equipe muito pequena que isso facilita muito no documentário, o contato com as pessoas, então logo que meu primeiro equipamento foi 16mm uma Escler pequena, silenciosa para trabalhar com som direto, foi com essa também que fiz Iracema, para filmes maiores, e depois logo que saiu o video8 eu comprei a câmera vídeo8 eu achei fantástico poder trabalhar com uma câmera tão pequena, a fita de vídeo que dura uma hora as fitas de 16 eram caríssimas, dava para gravar só 10 minutos cada vez, isso facilitou muito apesar da qualidade ser precária na época do vídeo8, mas isso melhorou muito, hoje com HDTV, eu tenho uma pequenininha eu estou satisfeitíssimo, acho que eu cheguei ao meu ideal, uma câmera que é um pouco maior que a palma da minha mão, com uma qualidade profissional, isso te dá uma liberdade muito grande, não preciso de equipe, não preciso de grandes recursos e então basta a idéia na cabeça e a câmera na mão, a gente sai e faz bons trabalhos.

Todo cineasta começa com curtas, os fatos mostra isso mesmo, a pessoa faz um curta, ganha uma projeção e vai para o longa e nunca mais volta para o curta, ou dificilmente volta para o curta. Você acha que para os próprios cineastas, o curta é considerado um gênero menor?
Absolutamente, não é em nada um gênero menor. É claro que se começa pelo curta, porque você não vai investir uma fortuna que custa o longa, no primeiro trabalho. Você tem que primeiro, adquirir experiência, então como qualquer arte você tem que amadurecer, você tem que conhecer, você tem que ter experiência, e essa experiência você faz exercitando para você se tornar cineasta é caro é complexo, então você começa com curta, que vamos dizer em termos de produção é mais simples, custa menos, é o caminho natural realmente começar pelo curta. Ai tem muita gente que fica no curta, e eu não concordo com você, tem muito cineasta de longa-metragem que faz curta também, você vai encontrar curta em toda história do cineasta de longa-metragem. No começo, principalmente claro, mas também tem muitos que fazer curtas depois, ou médias ou documentários, quer dizer, um cineasta que por exemplo começa com documentário, vai para a ficção e volta para o documentário, eu acho que não tem uma regra, mas é claro que a tendência quando você se realiza como cineasta, os seus sonhos ficam mais ambiciosos não cabem no curta, tendem mais a serem longas.

O curta tem um poder de síntese muito grande, longa, ainda mais para quem faz documentário, a gente já precisa de mais tempo para poder contar uma história você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de metragem?
È como um conto e um romance, você pode tem um conto na literatura né, um conto curtíssimo, que conta uma historia extremamente densa, com poucas páginas, e você pode escrever um romance de 400, 500, 600 páginas, é essa a diferença entre o curta metragem e o longa metragem, eles dois são igualmente densos e uma boa história bem contada não tem importância se ela tem 10 minutos ou 2 horas entende?

Qual é o curta que te chamou atenção, um curta que você gostou?
Tem um média-metragem que foi fundamental na minha decisão de fazer cinema que é o “Aruanda” do Linduarte de Noronha, era um filme realizado no início dos anos 70 e feito no Nordeste, preto e branco, 16mm, e aparentemente muito precário e quando eu vi, ainda não tinha pensado em fazer cinema e quando eu vi esse filme, que é um documentário dramatizado, eu disse poxa vida, isso eu posso fazer, isso é meu universo, isso eu gostaria de trabalhar sim, então foi um exemplo decisivo para mim de fazer cinema, o Aruanda do Linduarte de Noronha. Agora eu vi inúmeros curtas fantásticos, agora com a internet facilitou demais a distribuição do curta que antes era restrita a praticamente a antro do cinema, nem os cineclubes passavam curtas, e a internet trouxe o brilho e abertura para o curta e eu acho isso sensacional, eu acho uma forma de fazer cinema tão contundente quanto o longa.

Com a cultura digital, com esses recursos mais fáceis tem uma grande proliferação de curtas, todo mundo pode fazer um filme, pode fazer tudo mais. O que você acha que para diferenciar desse grande volume de curtas, o que você acha que o cineasta tem que fazer, porque às vezes a pessoa faz um curta sem muito critério tanto com a estética com a linguagem. O que você acha que deve fazer para diferenciar um trabalho de um volume tão grande de curtas?
Em todas as artes você vai encontrar de tudo, do bom, do ruim, do experimental, então isso acontece com o curta também, você tem um monte de lixo e tem as coisas boas isso em qualquer arte, é uma questão de você procurar, você imediatamente, quando você vê os primeiros quadros de um filme você já sabe se pelo menos é um filme que interessa ver ou não. Mas eu acho que faz parte quando você está montando de contar para os espectadores o que é bom e o que é ruim.

Acho que é interessante, mas ao mesmo tempo passa qualquer coisa, você não tem critério nenhum, tudo esta lá, ate uma coisa boa pode ser encontrado lá, mas eu acho o trabalho que vocês estão fazendo é importante por que vocês vão selecionar, vocês vão indicar, vocês vão explicar porque uma coisa é boa e outra não é boa para o público poder diferenciar isso e saber achar a coisa certa, é difícil a divulgação do curta, todos os filmes é difícil, então faz parte desse trabalho de vocês, apontar o que é bom, divulgar o que é bom o que é serio.

O curta tem pouca projeção, tanto na mídia que jornal não fala da estréia de um curta, da produção de um curta, e no cinema também dificilmente passa, você acha que então o caminho é a rede mundial que você pode publicar para não ficar dependendo tanto das distribuidoras quanto da mídia. Qual o caminho que você aponta para que as pessoas vejam o curta? porque as pessoas querer fazer, gostam de fazer e querem que as pessoas assistam e conheçam seu trabalho.
Não é bem assim, todos festivais brasileiros, todos, tem curta metragem, quer dizer, longa e curta, em qualquer festival você vai encontrar curta, seleção de curtas, premiação para curtas, nos editais, nas premiações, sempre o curta está presente, não está fora não, ele tem a mesma presença nos editais como tem o longa e o documentário. No cinema é claro que é mais difícil, porque ele não preenche o tempo de cinema, a idéia de passar antes como já existiam, obrigar os cinemas a passarem curtas acho que não funciona, não é por ai, acho que surgiu uma enorme abertura para dar visibilidade ao curta que é a internet, a internet hoje de barda larga tem muita qualidade você pode fazer um filme, você pode baixar um filme e ver ele na sua televisão, no seu home theater com a mesma qualidade de um filme, e acho que ele está sendo distribuído pela internet, há uma procura da garotada na internet pelo cinema, pelo curta. A dificuldade que o curta encontra é a mesma do cinema, um filme longa metragem hoje tem maior dificuldade de chegar ao cinema, mesmo os premiados em festivais e tudo, só para acrescentar, o único filme presente oficialmente no festival de Cannes esse ano é um curta metragem.

E por que você acha que não funciona o curta vir antes do longa?
Funciona, só não funciona para a distribuidora, entende? Porque para ele é uma despesa a mais que não acrescenta, o cara compra o ingresso, então ele quer tornar a coisa mais barata possível, por que mais tempo de exibição, por que pagar os direitos entende, então ele prefere não fazer isso.

Fale sobre a TV Navegar, que também está um trabalho interessante, num campo que também é esquecido e pouco conhecido pela grande população.
É o seguinte, há alguns anos para cá junto com o Beto Lacerda, no Amapá, agente desenvolveu um projeto chamado Navegar Amazônia, que é um barco regional, que no andar de cima tem um laboratório multimídia e agente convida artistas e faz oficinas. Tem oficinas de cinema de vídeo, e agente produz tudo que é feito nessas oficinas para o site, o site chama-se navegaramazonia.org.br, e aí nós desenvolvemos um projeto chamado TV navegar, nós queremos fazer uma TV móvel na Amazônia, Amazonia TV de banda larga de internet, uma TV que pode transmitir e receber, tanto mostrar o que a população ribeirinha está fazendo nesse laboratório, e ao mesmo tempo eles também podem ver nesse laboratório o que acontece lá fora. Isso tem funcionado muito bem, nós já estamos com uma produção bastante grande, não só curtas, mas média metragem também que podem ser vistos, podem ser baixados no nosso site, e é um projeto que está me fascinando muito, estou me dedicando bastante a ele, e agora agente está trazendo esse barco para o site Second life, nós temos uma ilha chamada Amazon land, e nessa ilha você vai encontrar uma réplica desse barco, e entrando na réplica desse barco, você vai ter um link com o barco verdadeiro.

Dos filmes que foram produzidos, gostaria que você falasse um pouco sobre eles, foram produzidos sob sua orientação, da orientação da sua equipe e feitos pela população ribeirinha?
Tem de tudo, quer dizer, são filmes resultados das oficinas, dos encontros com os artistas.

Muito acontece no barco, o trabalho maior que foi feito no ano passado, nós convidamos vários músicos, Jorge Mautner, Nelson Jacobina, foi Adalto Bacarsé também cineasta, e eu, e essa viagem ela foi toda registrada e nós editamos e deu o filme um documentário sobre a viagem do navegar com Jorge Mautner, chama-se Navegar Amazônia, uma viagem com Jorge Mautner, tem 50 minutos, está disponível no site www.navegaramazonia.ogr.br pode ser visto em screaming, e tem outro, por exemplo, um dos web máster da nossa equipe do navegar, ele produziu um DOCTV e passou agora o mês passado que chama-se alô alô Amazônia que é muito interessante, tem o trailler desse DOCTV também na nossa TV navegar, tem um filme feio por eles que é um evento religioso, uma procissão que está no barco, tem mais recentemente uma viagem que eu com Dráuzio Varella pelo rio Negro que também está na nossa TV navegar, o projeto ainda está em desenvolvimento, mas eu fiz um pequeno termo de 5 minutos quem tem que ser baixado no sistema. É uma base experimental e que está aberto, agente aceita trabalhos, agente aceita voluntários que queiram trabalhar nas oficinas quem está interessado pode fazer o contato através do site.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Eliane Caffé

A diretora iniciou sua carreira com três filmes de curta-metragem que são: ‘O Nariz’, ‘Arabesco’ e ‘Caligrama’. Narradores de Javé é seu segundo filme longa-metragem como cineasta. Seu primeiro longa se chama Kenoma.

Você acha que o curta é um gênero menor?
Não, não acho que o termo é menor, acho que é um trabalho diferente, é uma linguagem que predispõe a síntese, é um outro jeito de construir a narrativa, você escolher um tema e desenvolver o tema num formato curto, todo mundo sabe que tem pessoas que conseguem desenvolver muito bem o longa e não conseguem as vezes formatar uma história num curta e vice-versa, então isso eu acho que demonstra que são estruturas totalmente muito diferentes de trabalho.

O curta tem um poder de síntese muito grande, você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de rodagem?
Quando a gente fala contar uma história, já pressupõe alguma forma certa de narrar, alguma coisa que você desenvolve meio, começo e fim, e que tenha toda uma trajetória, e que você consegue aprofundar varias dimensões do personagem ou da trama, enfim, então quando a gente fala contar uma história dentro de um curta às vezes, contar uma historia a gente traz como referência esse formato. Eu acho que tem outra forma de contar uma história, a gente não precisa sempre, através, vamos dizer assim, dessa narrativa mais convencional, mais clássica. E o curta eu acho que por ele ter esse tempo reduzido, ele permite quase você se colocar, é um desafio no sentido de que na hora que você tem que fazer aquilo acontecer dentro desse tempo, você se coloca frente a uma experimentação, porque você tem que tentar meios e formas de fazer aquilo se expressar nesse tempo, e é a busca dessa maneira e dessa forma de como fazer tudo se expressar nesse tempo, as vezes o qual é se caracteriza como uma experimentação.

As vezes você nem está pensando, eu vou fazer uma experimentação, mas isso acontece, porque não há outra maneira de você exprimir aquela idéia a não ser fazendo aquele percurso, e as vezes é o percurso é que é interessante, e também o fato de você não ter a pressão do mercado, enfim, o curta não está sobre o impacto de uma expectativa de resposta do mercado grande até pelo volume de investimento que se faz, então eu acho que tem uma série de coisas que fazer do curta um formato, enfim, por isso que as vezes a gente associa ao iniciante, o cara que vai começar cinema ele começa pelo curta porque é mais fácil em termos da captação, não quer dizer que é mais fácil em termos da linguagem, mas da captação dos recursos para ele realizar, com certeza. Então por isso que às vezes fica essa associação do curta como algo de iniciante, acho que tem muito mais a ver com o fator econômico do que estético.

Por isso que a gente fala porque a maioria dos cineastas começam com o curta dai obtém um sucesso, com critica ou com premiação, e acaba indo para o longa e nunca mais faz um curta. Você acha então que ele é marginalizado entre os próprios cineastas, pelo próprio pessoal do meio?
Acho que seria interessante, eu acho que é engraçado pensar porque que isso acontece, não sei se é porque na medida que você direciona sua carreira para o longa, é tanta coisa que acontece no processo do longa, no projeto de longa geralmente, vamos dizer, numa produção mais independente, numa produção média, que tem levado na maior parte dos fiscalizadores, de 4 a 5 anos desde que se começa a ter a idéia até a hora em que você termina e está na tela, e é um conjunto de experiências tão intensas durante esse percurso, tão grande que eu não sei , parece que é como você trocasse o canal, mas é uma pergunta interessante, porque a gente não exercita o curta, até nas entre safras entre um longa e outro, também não sei porque qualquer coisa que se movimenta nesse desenho hoje de produção, que não seja aquele que você faz com sua câmera, que você está super acessível, você pode ter uma câmera e faz seu filme.

Depois quando estiver pronto você pode até distribuir ele na internet, ou você vai tentar grana para passar ele para película, enfim, tem gente, muita gente fazendo desse jeito, nesse desenho, então é um tipo de produção que você não precisa tanto daquela figura, do produtor, você não precisa tanto daquele, vamos dizer assim, de toda aquela estrutura que vem junto quando você faz um filme. Então, eu sei também assim, que para muitos diretores, o fato deles não fazerem curtas de novo é que só de pensar que ele tem que movimentar uma estrutura para poder realizar, por mais curto que seja esse filme, sempre ele, nesse desenho de mercado, ele custa se você quer ir para cinema vai custar, ai o cara pensa: puts, tenho que ir atrás de um produtor, tem que movimentar orçamento...
Então ele já prefere já fazer a captação para projetos maiores, enfim, não sei se isso pode ser um dos fatores.

Um dos fatores também pode ser a pouca repercussão que isso dá na mídia e no público, porque o curta é para um público seletivo, que busca mesmo conhecer, diferente do cinema que tem uma divulgação. Você que isso também é um fator que pode atrapalhar?
Com certeza, acho que também esse é um fator, o próprio fator do exercício quando a gente está executando, a gente exercita pouco, tudo por causa desse modelo de produção, então por exemplo, o exercício de filmar o cinema independente ele é muito restrito, também acho que isso é um fator, o fato de você não ter a possibilidade, por exemplo se eu tivesse possibilidade de estar exercitando o curta talvez estaria presente na minha vida hoje, mas como cada projeto é tão artesanal ainda num certo sentido, então é paradoxo porque cada vez mais a produção de cinema vem se intensificando cada vez mais em termos de financiamento, através das leis e tal, mas por outro lado a estrutura para reger isso ainda é muito artesanal. A gente tem uma coisa muito empresarial, são pouquíssimas as produtoras que funcionam assim, isso faz com que cada projeto, seja longa ou seja curta, ele demande muito esforço do realizador, muito tempo, então também acho que pode ser um aspecto, além desse que você falou, que eu acho que é verdade de não ter muito espaço na mídia de ter algum diretores que tenham essa preocupação.

Tem um monte de gente fazendo curta, ainda mais com Youtube!, tem um monte de cineasta fazendo vídeo e tudo mais, o que você acha que, para um cineasta, para um cara que faz um curta, destoar desses curtas todos, dessa avalanche de curtas que tem por ai, as vezes sem preocupação com estética, mas por fazer e tudo mais, o que tem que valorizar um curtametragista?
Eu acho que não só o curta-metragem, como acho isso é uma expressão de um momento da nossa época, a dificuldade de você às vezes valorizar o conteúdo, a pesquisa, a investigação, ela é como se hoje em dia fosse parte de um deslumbramento, é como um brinquedo novo que você não larga aquele brinquedo, vaio testando as possibilidades, então eu acho que tem muito isso, a gente está numa transição, a gente está bem num momento em que isso esta acontecendo, então youtube se eu pensasse, sei lá, a 15 anos atrás, menos, 10 anos atrás, não existia esse veículo, é um veículo novo e muito poderoso, porque ele atinge assim o mundo inteiro, imagina você de repente saber que você pode fazer alguma coisa, expressar alguma coisa, que eu acho que é uma necessidade inerente da gente, e colocar num canal que você sabe que, então eu acho que essa proliferação que tem é um primeiro contato com uma ferramenta e que eu acho que ela vai ficar, não vai ter retrocesso, mas é como se você ensinasse a ler e a escrever, de repente ele tem um lápis, ele tem um desenho para fazer, e acho que outra coisa é a dificuldade da gente trabalhar o conteúdo e isso é uma coisa que não é só no cinema , no curta, está em geral, nas artes com o um todo, na programação, em tudo, a gente em hoje uma proliferação de informações que muitas vezes ocupa o espaço da formação, então por exemplo eu vejo muito isso quando eu viajo para fazer os filmes a diferença que é você estar numa relação corpo a corpo, presente fisicamente em relação ao que você quer representar, do que você pegar pesquisa via internet...

Então acho que é isso, essa preocupação mais com a formação, você se antenar um pouco, buscar interesse na medida com que você se impulsiona na realidade, por exemplo, São Paulo é uma cidade que a gente conhece muito pouco, você pega um dia de manha e vai lá para o mercado central, vai para o Brás, sabe essa coisa de expedicionário que a gente perdeu muito, porque hoje em dia como tudo já chega para gente, já chega filtrado, então essa motivação, as vezes ela se realiza muito... E eu acho que isso se reflete, porque ai as pessoas começam a criar se auto-referenciando, por exemplo, sai um negócio no youtube, é incrível, todo mundo assiste, então o outro vai querer fazer um pouco influenciado por isso, as vezes não sai desse circulo, acontece muito nesses guetos que a gente vê a dança hip-hop então todo mundo vai viver isso, eu acho que a coisa da internet tem muito isso, é um fenômeno novo e difícil e que está mudando o padrão de comportamento e de maneira de raciocinar. Fico pensando hoje em dia como será que a gente sonha, quando a gente sonha mesmo, porque o sonho tem uma linguagem tem uma dinâmica um ritmo, ai eu fico pensando, será que o fato da gente ter tanto audiovisual presente que faz com que agente descubra o sonho?