quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Cláudio Fontana

Cláudio Fontana é ator e produtor de teatro.

Qual é o grande barato de fazer um curta-metragem?
Eu acho que o curta tem a vantagem da objetividade, você tem mais vantagem em relação ao longa em termos de experimentação do roteiro, em termos de produção, evidentemente, e ao mesmo tempo pode ter mais conteúdo, pode ser mais dinâmico, a edição mais objetiva. Eu gosto de curta. Eu prefiro às vezes assistir um curta (às vezes assisto na televisão quando passa, no Canal Brasil festival de curtas) do que assistir um longa, eu acho muito legal.

Você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de metragem?
Eu acho, a história necessariamente não precisa ser careta, assim começo, meio e fim. Às vezes um olhar, uma parte de uma história, sob uma visão de um diretor, eu acho muito interessante o curta justamente por isso, porque ele não tem o compromisso de ter começo, meio e fim.

Muitas pessoas consideram o curta-metragem como o grande movimento do cinema, porque não tem a pressão dos trâmites do cinema comercial, nem da mídia então dá para experimentar mais. Você acha que isso é o grande método para fazer um curta, para poder participar de um curta, esse poder experimentação, de ousadia?
Eu acho, como eu falei no começo, eu acho que o curta tem essa grande vantagem, você poder brincar, experimentar, sem compromisso com bilheteria, com o resultado comercial. Enquanto o longa não, você tem compromisso às vezes com o patrocinador, dar retorno de bilheteria, então é mais complicado. Por isso que o curta às vezes atrai atores, agente fala, pô, como esse cara vai fazer um curta, esse ator? É porque ele está lá para experimentar, ele monta, às vezes ele mesmo produz, o ator produtor gosta de curta também por isso, porque ele é mais fácil produzir.

E para um ator que gosta de ver seu trabalho sendo visto por milhares pessoas, o curta é meio restrito, o publico é seleto, e ele não tem o poder de distribuição. Como o longa que também encontra dificuldade, e o curta pior ainda. Isso de certa forma chateia quando as vezes a intenção de fazer um curta, e fala putz, eu vou fazer e ninguém vai ver. Isso às vezes é um impositivo?
Eu acho que não, acho que quando me chamam para fazer um curta eu não penso nisso, não penso no retorno que isso vai ter na minha carreira, ou no retorno financeiro. Penso justamente o que me atrai no roteiro, se o roteiro for legal eu até topo fazer numa boa, justamente pelo roteiro e pela possibilidade de inovar, experimentar novas coisas. Seria um risco muito maior se eu tivesse que experimentar em um longa, em um roteiro que tenha o compromisso de ser mostrado. Como o curta é descompromissado, às vezes o resultado é instigante para o ator.

Como deveria ser uma solução para esse fato, tem o Youtube que está ai. Você acha que tem que ter outras formas de incentivo de exibição?
Acho que sempre, o governo não faz a parte dele. Em termos de cultura, o governo é completamente omisso, principalmente nos últimos anos. Para artes cênicas nem se fala, acho que para cinema também, não aproveitou o boom que teve no cinema há algum tempo atrás, deixou a peteca cair. Acho que não há incentivo para o cinema, os festivais de curtas não existes praticamente, mesmo os de longas. Acho que o governo tem que fazer a parte dele para estimular a criatividade e a criação, estimular os roteiristas principalmente. É isso que falta no Brasil, roteirista de cinema, dramaturgo ainda consegue, eu acho que os dramaturgos vão aparecendo para o teatro, para cinema os roteiristas estão inibidos porque não tem incentivo financeiro.

Tem muitos atores que vão para trás das câmeras e realizam, fazem experimentação. Você pensa em produzir e dirigir um curta futuramente?
Não sei, uma vez eu pensei em dirigir teatro, mas eu ainda olho um texto de teatro, da mesma forma que eu olho o roteiro de cinema, eu olho sempre com a visão do personagem, do ator. É difícil para eu olhar como diretor, você precisa mudar um pouco, você precisa ter o que dizer de uma forma muito mais, você precisa estar muito mais preparado, para poder dirigir. E eu acho que eu ainda não tenho esse preparo, eu preciso ler mais, estudar mais, para poder chegar e ter peito para poder dirigir. Mas eu acho que isso vai acontecer na minha carreira como acontece na maioria da carreira artistas.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Eva Wilma

A premiada atriz tem em seu currículo uma série de atuações em filmes históricos do cinema nacional.

Em 1952, o diretor italiano Luciano Salce convidou-a para fazer um participação como figurante no filme ‘Uma Pulga na Balança’ na Companhia Cinematográfica Vera Cruz, simultaneamente, participou do documentário do IV Centenário de São Paulo ‘Se a Cidade Cantasse’, do diretor Tito Banini.

Eva Wilma, participou também do filme ‘São Paulo S/A’ do diretor Luiz Sérgio Person.

Conte sobre a sua relação com o cinema nacional.
Pois é, eu acho até que foi no cinema que eu falei pela primeira vez, ou seja, o trabalho de atriz. Porque eu programava uma carreira de bailarina clássica, tinha vivido uma grande vitória que foi ser aprovada nos exames para o ballet do ‘IV Centenário’, eu estava em plenas aulas, isso em 1953, porque o ballet se apresentaria só no fim de 1954, e então no começo de 53, eu já aprovada e fazendo aulas, amando o coreógrafo húngaro, foram 600 candidatos para 40 vagas, eram 40 bailarinas e 20 bailarinos, mais ou menos 600 candidatos do Brasil inteiro para 60 vagas, e eu fui aprovada, mas acho que a primeira grande vitória semi-profissional. Só que na época eu conheci esse jovem, pai dos meus filhos com quem eu fui casada durante 21 anos, o John Herbert que já tinha feito estudos cinematográficos, junto com o José Renato que foi o fundador do Teatro de Arena... E eu vou retroagir, antes do balé ‘IV Centenário’, quando o grupo de 14 moças da Madame Olenewa, que era a idealizadora do corpo de baile do teatro Municipal do Rio de Janeiro, que fundou, que organizou. Ai ela veio para São Paulo e eu era uma das alunas dela, nós fizemos uma viagem dançando de um navio do loide brasileiro que saiu de Santos e foi até Manaus. Nós fomos em todos os teatros pela costa brasileira, foi a primeira vez que eu tive a oportunidade de me apresentar nesses verdadeiros templos, nos quais eu voltei várias vezes. Só que naquela ocasião, nós fizemos como bailarinas, aí as 14 moças que tinham feito essa viagem com Madame Olenewa, que era um navio, acho que em 1949, levava uma exposição da indústria paulista a bordo, navio de ‘Don Pedro I’, e levava essa exposição. Meu marido conseguiu incluir uma pequena exposição de arte paulista que era o ‘São Paulo Ballet de Maria Olenewa’, quando nós voltamos depois de dois meses, nós gritamos liberdade ou morte e formamos o grupo experimental de ballet. Eu estava ensaiando os três espetáculos com esse grupo na qual nós nos apresentamos em três espetáculos no Municipal de São Paulo, e eu estava no palco ensaiando e na platéia havia uma filmagem, para o filme ‘Ângela’, do Tom Payne , Vera Cruz, ele foi casado com e Eliane Lage, que está viva e feliz, morando em Goiás. Bom eu sei que o Tom subiu no palco e me chamou para um pequeno papel nesse filme ‘Ângela’, e lá fui eu para Vera Cruz, e lá cheguei a filmar uma cena, e com muito medo do namorado repressor. Eu consegui um atestado médico e não voltei nunca mais para concluir o filme ‘Ângela’, causei um prejuízo para o produtor do filme. Só que posteriormente nesse momento, que eu estava começando nosso papo, eu estava novamente no Teatro Municipal, ensaiando novamente, não me lembro o que, e tem novamente um grupo de rapazes da faculdade de direito filmando na platéia e ao beber água no corredor um deles aproveita-se do filho do meu padrinho, padrinho de batismo mesmo. E é apresentado a mim e acaba conseguindo meu telefone, veja você. Isso restou fazendo exames para o ballet do ‘IV Centenário’, uma vez aprovada depois de três meses, esse jovem que continuou telefonando, me convidou para ir um domingo ver as filmagens, ele saia do centro do estúdio cinema dos Tráficos e já estava filmando ‘Uma Pulga na Balança’, do Luciano Salce, o diretor.

Vera Cruz novamente, e eu fui passear um domingo na Vera Cruz. Começou com Anselmo Duarte me pedindo para, se eu permitia fazer algumas fotos, eu fiquei meio tímida, mas deixei fazer essas fotos, eu tenho essas fotos. Depois durante as filmagens, os quatro irmãos, Paulo Autran, Maurício Barroso, Rui Affonso e John Herbert, o Salce me viu assistindo e pediu, perguntou se eu não topava fazer uma figuração, uma pequena fala, numa cena de um velório, veja você. Eu topei, me vestiram, eu tenho um chapeuzinho, eu tenho foto dessa personagem, da roupinha, do chapeuzinho, e a fala eu lembro muito bem, que foi a primeira vez que eu falei como atriz, a fala era, um dos quatro dizia assim:

Precisava meu pai morrer para eu rever minha linda priminha?

E eu respondia – mas agora eu sou uma mulher casada.

Essa foi minha primeira fala como atriz, paralelamente eu já começava a assistir os ensaios do teatro de arena, e o José Renato fez um teste comigo e eu comecei a representar mesmo dirigida pelo José Renato. Mas depois paralelamente, eu conheci e fui chamada por um sujeito fantástico, enorme, gordo, vermelhão, chamado Mário Civelli, e eu assinei o contrato de dois anos com a Multifilmes. O que se pode imaginar que tudo isso me fez pedir demissão do ballet do ‘IV Centenário’ que foi o primeiro passo dificílimo da minha vida, mas realmente eu deixei a bailarina quietinha dentro de mim e comecei a dançar representando e falando. Os três filmes da Multifilmes, o primeiro foi o “O Homem dos Papagaios”, e eu tive a oportunidade de contracenar e conviver com Procópio, o segundo foi “O Craque”, se eu não me engano, com Carlos Alberto, que foi um dos primeiros filmes sobre futebol, e o terceiro foi “A Sogra”, novamente com Procópio.

Isso são, digamos assim, a primeira figuração e os primeiros três filmes, de uma carreira de 21 para 22 filmes com um a ser lançado ainda. E desses todos, a minha experiência, que eu gosto muito de relembrar foi com “Cidade Ameaçada” de Roberto Farias. Eu acho que o Roberto é um grande cineasta, um grande diretor e para mim foi uma experiência maravilhosa o ‘Cidade Ameaçada’.

Depois disso, evidentemente é impossível não citar “A Ilha” do Khouri, Walter Hugo Khouri, eu acho que Máximo Barro está nesses aí. Um abraço para você Máximo.

Depois disso, eu falo disso no livro biográfico, porque o Khouri era um esteta antes de mais nada, ele tinha um prazer imenso do lado estético, e ele era muito delicado, muito exigente. Depois disso eu venho com o fabuloso artista cineasta, o teatrólogo, abriu o ‘Teatro Augusta’, ele morava em um sítio onde tinha uma placa – cuidado cachorro bravo e dono louco, e ele me convidou para um filme “São Paulo S.A.”.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Mira Haar

Mira atuou na série infanto-juvenil Mundo da Lua, da TV Cultura São Paulo, ao lado de Antônio Fagundes e Gianfrancesco Guarnieri.

Qual é o grande barato de um curta-metragem?
O que eu acho que é bacana de um curta-metragem é que a idéia não fica a perder de um filme longa-metragem, porque um curta sempre tem a história dele sucinta, mas sempre eu gosto muito de ver, porque é como um telegrama onde você onde você tem as emoções, os sentimentos, mas não tem tanto tempo para fazer as divagações. Então as idéias e a comunicação são diretas, e eu gosto muito porque eu gosto muito de ler contos. Eu acho que tem a ver, porque ele em si é uma história quase que como um conto porque ele se fecha nele mesmo, você assiste e eu gosto muito, eu acho legal, acho que deveria sempre passar antes do filme, importantíssimo. Não passa, não tem espaço para o curta-metragem, eu já fiz alguns, eu gosto muito, videoclipes também conta, mas não é a mesma coisa. Videoclipe é uma coisa e curta-metragem é outra, porque o curta tem mais tempo que o videoclipe e a gente acaba vendo em festivais e coisas assim, mas no cinema é raríssimo você ver um curta.

Você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de metragem?
Nossa, existe o vídeo minuto que tem uma história inteira contada. Depende da perspicácia de quem faz, de saber mandar uma idéia, uma mensagem porque pode ser, cinema é tudo, é som, é cor, é movimento, então, imagina, com literatura tudo junto dá para fazer coisas incríveis. Dá para contar os dez mandamentos.

Fale da sua história com o curta-metragem.
Eu participava de um grupo em São Paulo o “Pod Minoga” dos anos 70 e naquela época a gente fazia uns curtas em super 8, tinha festival de super 8 então era mais fácil, porque como hoje que tem essas handcam, que é essas camerinhas agora digital, mas antes não. O que apareceu de mais prático era o super 8 que era uma câmera na mão, super pequenininha, e as pessoas começaram a poder ter isso e a gente fazia filminhos. E eu fiz faculdade de artes plásticas e também tinha trabalhos que eu resolvia com filmes super 8, participava, era convidada por colegas que faziam, como eu era atriz, eu participei de alguns desses super 8 e depois fiz curta-metragem no cinema mesmo. Fiz “Atirador de Facas”, com a Carla Camurati e fiz “Cintos com o Vento” que é um trabalho do Marcio Kogan, “Cerviter” que, aliás, é o cenógrafo dessa peça aqui. Eu fiz outro que eu não me lembro agora, do Inácio Zatz que é um rapaz muito legal, que faz uns trabalhos muito bons, eles eram da equipe e eu era amiga dele. Eles estimulavam muito as pessoas a fazerem trabalhos com o cinema, e eles faziam com o curta-metragem. Eu tenho um filho que estuda cinema nos Estados Unidos, e toda semana eu assisto, porque ele faz um curso onde eles têm que fazer um curta-metragem por semana. Muito legal, para ele é uma coisa fantástica poder estar trabalhando assim.

E para uma atriz qual que é o processo, diferença, por exemplo, do teatro, do curta, de uma novela, do longa. Qual que é a preparação para poder encarar um curta-metragem?
Acho que a preparação do personagem sempre é a mesma, porque você tem que entrar dentro daquele clima, daquele ambiente proposto, da história e tal, como você faz para câmera e como você faz para o público é diferente, porque no teatro você faz para várias câmeras, mas estão todas na sua frente, por exemplo, quando o palco é italiano. Agora no cinema tem aquela coisa de você estar exatamente enquadrada em um lugar específico, porque não é só você, o diretor está pensando, está olhando o todo, seu fundo, o lado, como você está, não está, a imagem inteira, então você tem que, além de estar dentro da personagem, além do que lembrar o que você tem que fazer, você tem que estar em sintonia com o diretor na hora de fazer o filme. E o filme é assim: aquela hora é a hora mais importante quando fala rodando, assim pode ter uma, duas, três tomadas, mas aquela hora é a hora de você render. E o teatro você pode, um dia você faz, outro dia você aprimora, no cinema é mais complicado, então tua concentração tem que ser muito grande no cinema, e o jeito de falar com a câmera, não é com a câmera, mas é falar para o que está te captando a imagem.

Você tem algum trabalho que está em vista com o curta?
Eu queria transformar essa peça em um curta-metragem.

A peça “Mammy vai à lua” você acha que dá para encaixar, porque a peça tem 80 minutos, e o curta tem até 30. Então, o que eu pensei era assim, pegar alguns quadros, aí precisa fazer um jeito de encaixe, onde essas cenas aconteçam realmente de algum jeito sucinto, que é o mundo de uma dona-de-casa numa cozinha. Não é difícil de por tudo ali. Na verdade acho que seria muito melhor, mas eu não queria fazer aqui, eu queria fazer numa cozinha mesmo.

sábado, 12 de setembro de 2009

Jean-Claude Bernardet

Jean-Claude é um dos melhores críticos de cinema do país. Já, inclusive, dirigiu e participou de alguns clássicos do nosso cinema.

Qual é a importância do curta-metragem para o cinema mundial, especialmente no Brasil? 
Houve uma época, quando não existia escola de cinema, em que a formação dos cineastas era feita através do curtas, nos anos 50. Glauber, Saraceni, Joaquim Pedro, Leon Hirszman. Todos eram referenciados pelo curta-metragem, portanto, no curta que eles aprendiam a construção, começaram a trabalhar... Em meados dos anos 60, formaram-se as escolas de cinema profissionalizantes nas universidades, e uma grande parte da produção de curtas acabou sendo realizada nas escolas. Nos anos 80, houve o chamado boom dos curtas, que eram em parte feito por alunos das escolas, em parte com produção e equipamento das escolas, em parte com recursos obtidos fora das escolas, e que tinham uma característica, que em geral o curta-metragem, é mais indicado, ou é filme experimental, ou tem os temas documentários. Nos anos 80, o curta-metragem no Brasil, se torna muito um documentário de ficção, porque o que era bastante novo, e houve uma série de filmes muito bons, que deu uma repercussão muito grande sobre o curta-metragem brasileiro, e nesse momento, em São Paulo pelo menos, se forma as mostras de cinema, porque essa produção de curta-metragem, a produção estudantil, e a produção geral, não tinha muita vazão.

Existia uma lei, chamada ‘Lei do Curta’, que fazia com que se pudesse colocar um curta antes de cada longa. No qual o curta-metragem recebia uma porcentagem da receita do longa, isso possibilitou a existência de um fundo que caia recursos para produção de um curta-metragem. Isso não ajudou a criar um público para o curta-metragem, porque muitas vezes o curta-metragem associado ao longa, se nenhuma relação, os exibidores não queriam cogitar esses filmes, então eles pegavam os filmes, pagavam os 5% e não exibiam o filme. De forma que o público de curta-metragem acaba se formando através mostras do tipo das que são iniciada no MIS (Museu da Imagem e do Som) ou trabalhos do Chiquinho, que teve bastante repercussão.

Alguns cineastas começam com o curta-metragem, obtém sucesso, vão para o longa e nunca mais voltam para o curta. Você acha que o curta é marginalizado no próprio meio cinematográfico?
Eu acho que a duração do curta não é fácil dentro do mercado, não há propriamente uma exibição de curtas, a não ser em algumas cidades, que alguns cinemas vêm passando. Na literatura, o conto, que seria uma novela curta, que seria um romance curto, principalmente no Brasil, tem como ser editados, porque tem escritores, como Dalton Trevisan, que está absolutamente especializado em contos. O mercado cinematográfico não possibilita esse tipo de divulgação e não tem muita circulação de forma mais estável, e claro, que algumas coisas foram criadas, do tipo Curtas às 6 horas, ou o que fez o Unibanco com a Petrobrás para criar um espaço de visibilidade para esses filmes. Mas é relativamente restrito isso. Há também alguns problemas, porque quando você faz a programação por exemplo, dos festivais de curta-metragem, você percebe o seguinte, que as sessões não podem ser muito longas, porque a partir de certo momento o público começa a embaralhar os temas, não se lembra qual é o filme que viu, porque uma projeção de 1 hora e meia de um longa metragem é diferente de 1 hora e meia de curtas, dá 6, 8 filmes de curta-metragem é uma coisa completamente diferente. De forma que não há propriamente um mecanismo de colocar esses filmes em contato com o público, de vez em quando a TV Cultura ou o Canal Brasil apresentam filmes de curta-metragem. Mas por outro lado, eu pessoalmente acho o curta-metragem uma expressão plena em si. Não é apenas uma preparação para o longa, eu não vi o atual filme de longa-metragem do filho do Barsinski, que está em cartaz atualmente, mas os curtas anteriores dele, são filmes plenamente organizados, são filmes como ‘Janela’, portanto acho que é um gênero plenamente válido, mas por não ter meios assegurados de circulação acaba sendo mais usado como uma fase de transição, um momento de passagem em direção ao longa.

O senhor acha que isso acaba contaminando a própria critica, porque não sai quase nada de matéria sobre curta-metragem, tem poucas pesquisas sobre curtas. Você acha que isso contamina o meio?
Eu acho que sim. O curta-metragem em geral, na imprensa aparece em duas situações: quando há algum evento, tipo festival internacional do cinema curta-metragem, mostra paulista ou desse tipo aí há comentários, ou então quando se comenta um longa-metragem de um cineasta, e que se relembra, você faz uma citação dos seus trabalhos anteriores, senão não tem espaço específico. Não tem.

Eu estava na reserva cultural na mostra sobre o senhor, seu trabalho, e não tem um curta ali. Você nunca trabalhou com curta?
Eu pessoalmente nunca fiz um curta, o eu já fiz foi um ou outro curta como ator, mas como realizador não fiz. Tem um vídeo que está na mostra que é sobre os anos 60, que tem 30 minutos. Pela definição legal, ele é um curta-metragem, porque curta-metragem vai até 30 minutos, o outro “São Paulo Sinfonia e Cacofonia” que tem 40 minutos, esse São Paulo não entra em nenhuma categoria, porque ele é longo demais para ser um curta, e curto demais para ser um média, porque o média atualmente tem 50 minutos, e evidentemente não é um longa-metragem. Essa duração de 40 minutos é uma catástrofe.

O curta metragem é o grande movimento do cinema? Porque ele é mais experimental, porque ele foge um pouco dos cânones do cinema longa-metragem...
Em tese deveria ser assim, mas na prática eu acredito que não seja. Na produção recente em São Paulo tem muitos filmes que não estão totalmente prontos ou que estão em finalização, como “Otávio e as letras” do Massagão que é um longa-metragem, como o “Fim da Picada” do Christian Saghaard, são filmes experimentais, acho bastante corajosos, bastante interessantes, e são longas-metragens. E às vezes agente pensa que o curta fosse de menor produção, freqüentemente de estudantes, de escolas, representariam uma área de representação mais audaciosa que o longa, mas eu não acredito que isso de fato esteja ocorrendo. Isso não quer dizer que não haja curtas experimentais e arriscados, mas eu acho que não é uma regra, apesar de que aparentemente deveria ser assim, mas na prática não é.

Você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de metragem?
Dá, às vezes na escola, eu como professor de roteiro, como professor associado a disciplinas de produção, que você nota que freqüentemente os curtas são longas comprimidos. O curta deve ser pensado na sua duração, você tem um estilo, uma narrativa, seja lá o que for, que seja condizente com a sua duração, se não isso não vai caber em 10 minutos tem que cortar isso, tem que comprimir essa cena, ai as informações acabam não passando. Há uma maneira de pensar, o curta, existe a relação dele em literatura, você vê o trabalho feito pelo Dalton Trevisan, no sentido de passar contos de meia página, contos de um ou dois parágrafos. O pensar na duração do curta, e trabalhar a duração curta, não significa trabalhar numa duração longa comprimida, o curta tem que ter o seu ritmo específico.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Carlos Reichenbach


Carlão, como é mais conhecido, dirigiu diversos filmes e fotografou dezenas de trabalhos cinematográficos.

Qual é a grande importância que o curta-metragem deu para o cinema?
Eu acho que antes de mais nada, o curta-metragem é o grande espaço de experimentação, o curta-metragem é realmente o espaço onde envolve o futuro cineasta ter condições de poder arriscar, de investir na linguagem, na experimentação, na inserção, não tem obrigação com o mercado, ele não tem obrigação com a sala de projeção, ele tem obrigação consigo mesmo. Acho que não existe espaço mais livre do que o curta-metragem, acho que isso é um pouco porque ele pode ser enxergado como um campo de experimentação, um campo de experimento, não apenas como um portfólio, como uma espécie de cartão de visitas, ou como um vestibular para o longa-metragem, eu acho que inclusive, existem cineastas que enxergam o curta-metragem como um gênero específico, que inclusive realizam um determinado tipo de trabalho e voltar para o curta-metragem, voltar para aquela obrigação, aquele tempo determinado, e aquelas possibilidades infinitas de poder arriscar aquilo que ele não podia fazer no longa-metragem.

No começo você falou que o começo do trabalho de um futuro cineasta, e às vezes tem muitos cineastas, que começam com o curta, a depender do sucesso, vão para o longa e não voltam nunca mais para o curta, e tem cineasta que vira e mexe faz curtas. Por que você acha que a grande maioria não volta para o curta, ele é marginalizado dentro do próprio meio talvez?
Não, porque no fundo no fundo, 90% de quem pretende fazer cinema e enxergam o curta-metragem como o portfólio, enxergam o curta como a mostra do seu conhecimento de cinema, e não como um gênero em si. No meu caso específico, no meu caso pessoal e muito específico, eu nunca fui muito interessado pelo documentário, não pelo curta, pelo documentário, eu fui fazer, embora na verdade o meu primeiro filme tenha sido um curta-metragem, ainda foi como exercício de faculdade, eu fui trabalhar mais com o curta-metragem depois de pressurizado, porque eu enxergava que a possibilidade do curta-metragem era exatamente essa, exatamente fazer com o curta o que eu não podia fazer, ou seja, fazer um cinema de experimentação e investigação. No fundo o curta-metragem para mim é a possibilidade fazer um cinema mais conceitual, coisa que o longa-metragem não me permite. Não me permite ou eu não quero fazer, o longa-metragem tem um pouco esse caminho, essa característica de coisa mais narrativa, enquanto o curta-metragem não tem esse compromisso. Os últimos curtas-metragens que eu realizei foram curtas como ‘Olhar e Sensação’, ‘Equilíbrio & Graça’, são curtas conceituais, eu fiz pela necessidade de exprimir alguma coisa dentro de uma bitola, que me possibilitasse não ter compromisso com o mercado, o único compromisso é comigo mesmo.

Você acha que dá para contar uma história em tão pouco tempo de metragem?
Eu não enxergo o curta-metragem com essa visão de contar história, você pode aproximar o curta-metragem da literatura como um conto, tudo bem, é possível. Agora eu não me vejo muito, é que eu não enxergo o curta como uma experimentação de narrativa na verdade, para mim esse espaço, esses 10 minutos, não tem uma obrigatoriedade de trazer uma concisão, tem que ser uma idéia muito centrada. Para mim o curta-metragem é um espaço mesmo de experimentação, essa possibilidade que eu tenho de poder, inclusive refletir sobre determinadas coisas que o longa-metragem não me propicia. Foi no ultimo curta-metragem que eu fiz, que foi sobre o entendimento sobre duas religiões, na certa forma o catolicismo e o budismo. E como fazer isso? Só no curta mesmo. Em um certo sentido, aquilo tudo era sobre entendimento, sobre harmonia, e não sei se um filme meu de duas horas ia ter fôlego para falar sobre isso, eu acho que um filme de nove minutos tinha fôlego, por isso que eu chamo o curta-metragem não como um apêndice, mas sim indiscutivelmente, como num gênero próprio. O curta-metragem que eu busco assistir tem que ter um pouco esse caráter de conceituação desse cinema e também enxergado como uma forma de contar na verdade narrativamente um espaço que você não consegue ocupar em um longa.

Os seus filmes, os longas, são mais conhecidos que os curtas apesar de você ter um trabalho em curta-metragem, isso de certa forma te chateia? Não só pela mídia que não divulga um curta-metragem, que não sai uma critica para um curta, e que as pessoas também pouco assistem, a não ser aquele grupo restrito que vai em busca, ele é pouco divulgado?
Isso tem que considerar, a gente tem um problema com o espaço até no longa-metragem, o curta por exatamente por não ter esse vínculo comercial, esse vínculo industrial, esse vínculo com a distribuição e exibição cinematográfica, na verdade é distribuído para poucas pessoas. Isso não me chateia porque eu enxergo os curtas-metragens como uma complementação da obra, como recurso de comunicação de complemento de uma obra de vários filmes, não enxergo isso como um filme isolado na verdade, não sei dizer se isso me chateia, os filmes são exibidos e estão a disposição em alguns lugares, um dos curtas-metragens, por exemplo chamado ‘Arte Cidade’ o outro que foi anexado a convite da Petrobrás como projeto de vários curtas, e eu sempre faço questão de incluir esses filmes nos DVDs dos longas por exemplo, então você pega o DVD de “Dois Córregos” e você tem o ‘Olhar e Sensação’, você pega o DVD de “Garota do ABC” você tem ‘Equilíbrio & Graça’. Eu gostaria sempre fazer um curta-metragem, eu não tenho condições de fazer isso, mas se em cada filme que tiver sido lançado ter um complemento, como a gente faz no cinema, mesmo porque o filme conceitual, na verdade para mim, surge como uma oportunidade, nem sempre eu tenho essa oportunidade de poder realizar, eu não estou interessado em fazer curta-metragem narrativo, de contar historinha através do curta, estou interessado realmente em refletir sobre a minha época, isso é o grande espaço que o curta-metragem te propõe. Isso é um pouco como diz o cineasta... até júri de cinema: “não é importante você se comunicar com muita gente, em um certo sentido, o importante é você comunicar uma coisa importante para pouca gente que esteja preparada para essa conversa, para essa relação”

Evidente que no caso específico dos filmes conceituais o que revisa é o publico mais informado. É como se através do curta eu tivesse a possibilidade de dialogar com pessoas que tem o meu repertório, ou que tem uma informação próxima a minha, acho que todo mundo tem a necessidade de fazer isso, nos longas eu faço isso. Alguns longas que eu tento abranger públicos mais amplos, mais populares, outros que eu tento me comunicar com meia dúzia de pessoas que tenham tido uma experiência de vida parecida com a sua. Isso tem em qualquer meio de expressão, qualquer arte existe a mesma preocupação.

E tem algum curta que você esteja pensando em fazer, algum plano nessa área de curta?
Eu tenho muito interesse de fazer um terceiro curta que fecharia uma trilogia com ‘Olhar e Sensação’ e ‘Equilíbrio & Graça’, que se chamaria “Arquitetura e Fineza”, um filme sobre espaço, fiz um filme sobre o tempo, um filme sobre harmonia, eu queria fazer um filme sobre espaço, espaço físico, essa uma idéia ampla de tudo que é o espaço na verdade, também um filme conceitual, esse é um curta metragem que me possibilitaria isso, para poder fechar uma espécie de trilogia, e dá tempo em um determinado momento, de serem exibidos juntos, fechando uma idéia conjunta. Como eu digo assim: eu exerci várias atividades na minha vida, de qualquer forma o cinema chega muito próximo de outras manifestações culturais do qual eu já fiz parte, um bico em literatura, muito grande minha formação e totalmente literária, sou filho, neto, sobrinho de editor, tenho uma formação musical, eu estudei música clássica, estudei também música popular... eu tive grupo musical, eu faço música, eu estudei composição e arranjo, e minha grande frustração é não saber desenhar uma casinha, eu não tenho a menor habilidade para pintura. E através do cinema eu consigo de certa forma sublimar essa frustração, excluo inclusive fotógrafo, diretor de fotografia, operador de câmera. Vários longas metragens, 35 longas-metragem, onde eu estou de fotografia. Mas através dos curtas, onde eu consigo trazer, me estabelecer, consigo me manifestar, como pintor que eu sou, por isso que para mim , sei lá, o curta-metragem é tanto de experimentação e eu acho extremamente amplo, e como eu sou, vários cineastas também enxergam o curta-metragem como um gênero em si, e não como um trampolim para fazer o longa-metragem. Você quer ver um artista multimídia, numa amplitude, por exemplo de Arthur Omar, que realmente fez curtas-metragem extraordinários e conceituais, Joel Pizzini, tem uma série de outros, Fernando Severo. Existem vários realizadores que trabalham o curta-metragem como um gênero específico, isso que é importante. Talvez por isso mesmo, Carlos Adriano, vários cineastas para quem o curta-metragem é o gênero de cinema que agrada eles. É, na verdade, a bitola que ele encontrou para poder se manifestar, e não mostrar realmente um cartão de apresentação, olha como eu sei fazer um longa-metragem, como eu sei ser publicitário, como eu sei fazer uma novela de televisão. Eu vejo o longa-metragem como um meio de expressão, um filme conceitual se torna uma coisa enfadonha quando passa de um determinado tempo. Então esses cineastas citados acho que são os que melhor entenderam, enxergaram o curta-metragem como um gênero em si, são os nossos verdadeiros curta-metragistas, no sentido mais adulto da palavra. Eles perceberam o curta como um gênero mesmo, eu não quero fazer longa, eu quero fazer um filme de dez minutos, mas exatamente que estabelece um tipo de comunicação que não seja apenas narrativa, nem uma carta de apresentação para produtores, enxergam o gênero como um gênero em si. A grande possibilidade é de eu ter em dez minutos, estabelecer contato com pessoas que possuam a minha informação, o meu repertório, que possui determinado nível cultural. Para você estabelecer esse contato, vai fazer um vídeo de duas horas que é caríssimo, energia, para fazer um filme que vai atingir meia dúzia de pessoas privilegiadas, faz um curta. Não tem problema, em dez minutos, vinte, trinta minutos, o filme é muito amplo, a gente não pode ficar limitado a um tempo pré-determinado. Agora, eu acho que independentemente de qualquer coisa, esses filmes em algum momento chegam ao espectador buscado, seja o filme que for, o curta que for, na bitola que for.