quarta-feira, 25 de maio de 2011

Rejane K. Arruda



Rejane é atriz e pesquisadora na Universidade de São Paulo. Atuou nos longas ‘Corpo’, de Rubens Rewald, ‘O Veneno da Madrugada’, ‘Primavera’ (em finalização), 'Rendas no Ar' (em produção) e ‘Tanta’ (em finalização); e nos curtas ‘Edifício Cidade do Tesouro’, ‘Iminente’, ‘Cabra-Cega’ (em finalização) e ‘Medo de Sangue’ (em finalização). Rejane também está dando aulas de atuação para cinema na SP Escola de Teatro.

O que te faz aceitar participar de trabalhos em curta-metragem?
Acho que o curta, por ser sintético, traz um impacto. Ele geralmente abre para o poético e não está inscrito em certos vícios do mercado de longas. De maneira que tornou-se um gênero/formato muito interessante para uma atriz. Estou filmando o Medo de Sangue, do Luciano Coelho, e o considero exemplar neste sentido. Não que não tenha longas poéticos. Mas o curta, por princípio, é um pequeno poema, uma pequena obra-prima - que não repete fórmulas, e não precisa aderir a pressões.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Eu não sei - acho que seu quê marginal também tem a ver com isso no entanto - seu quê autoral. Nem sempre é necessária a mídia estabelecida - acho que o circuito alternativo inventa suas mídias e nestes circuitos alguns curtas podem virar mania - podem circular como algo precioso, como verdadeiros achados.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Eu não sei - acho que há público, um público de apaixonados por cinema. Mas talvez se isso tudo fosse - em parceria com a secretaria da educação - por exemplo - passado nas escolas... Acho que as novas gerações devem ter acesso a este formato (o curta), acho que seria importante para a formação deles, por exemplo. Muito importante: por suscitar um tipo de sensibilidade, e de questões... diferentes.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
Acho compreensível o sonho do longa. É uma possibilidade de um reconhecimento maior, de uma conquista de público e de mercado... uma responsabilidade maior também porque se trata de um empreendimento em geral com um orçamento maior, com uma equipe maior, enfim. Faz parte de uma trajetória eu creio. Tudo isso no entanto, não passa por normas ou fórmulas... pode-se ter uma vida dedicada aos curtas. E ter o reconhecimento público disto.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Não creio. São pequenas pérolas, tratadas como tais: com muita paixão.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Eu penso cada vez mais em estudar cinema. É fascinante que uma equipe de ¨x¨ pessoas esteja engajada a fazer de uma idéia, ou de uma imagem, de um vislumbre (afinal se começa assim)... um filme. Penso em um dia, sim, fazer, não sei se longa, não sei se curta, mas cinema. No outro lugar: no lugar ¨do que vê¨ e não ¨da que se dá ao olhar¨.

sábado, 21 de maio de 2011

David Kinski



David é ator, poeta e cineasta. Formado como ator pela Actor School Brazil e em cinema pela Academia Internacional de Cinema, já dirigiu 7 curtas-metragens sendo um deles (Cineminha) convidado a participar recentemente do festival italiano Curto In Bra.


O que te faz aceitar participar de produções em curta-metragem?
Para aceitar qualquer trabalho, seja como ator, diretor ou roteirista, tenho como permissa entender se o projeto comunica algo que realmente me faça sentido de alguma forma, ou seja, entendo que para comunicar bem precisamos “ter vontade” de dizer aquilo. Isso vale para os curtas também.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Bem, critica no Brasil é algo complicado de se analisar, pouquíssimos fazem um trabalho sério e contundente. Muito provável esse formato não tem espaço na grande mídia, pois a difusão de curtas no Brasil e como na maioria do mundo também é defasado ou desestimulado. Então como o grande público pouco tem acesso a curtas, pouco também se fala sobre eles na mídia, ainda é um formato marginalizado.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Se ao menos antes de cada longa-metragem fosse exibido um curta, já ajudaria bastante na sua difusão. Programas dentro também da TV aberta para esse tipo de filme não só ajudaria na exibição como na divulgação desse formato pouco conhecido.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
Sim é possível, mas penso que a maioria dos cineastas quando vão contar uma historia não querem se restringir ao tempo de duração de um filme. Existem argumentos suficientes para um pequeno filme e outros não. Obviamente pela viabilização de produção de um curta-metragem e pela liberdade também de experimentação que ele permite a maioria dos cineastas começam suas trajetórias com esse tipo de filme.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Penso que não, a grande maioria já produziu um ou sabem e entendem a importância do pequeno filme.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Sim, atualmente voltei ao teatro, pois em um período de dois anos acabei dirigindo 7 curtas, o que me deixou um pouco exaurido (risos). Mas tenho planos sim para voltar à direção no segundo semestre.

terça-feira, 17 de maio de 2011

Marcos Bonisson



Marcos trabalha com fotografia, vídeo e super 8. Ministra cursos de Artes Visuais no Ateliê da Imagem no Rio de Janeiro desde 2001. Ganhou a Bolsa Rio Arte 2000 com o projeto em vídeo Héliophonia, que abordava o Quasi-Cinema do artista Hélio Oiticica. Participou da 27* Bienal Internacional de São Paulo em 2006.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
Pode-se afirma que o cinema nasceu curta-metragem. De Edison aos irmãos Lumière, passando pelo genial George Méliès, os filmes pioneiros, ainda à época oitocentista eram quase exclusivamente de curta duração, mas pela limitação técnica, do que por uma opção estética dos seus realizadores. 'O Pátio', o primeiro filme de Glauber Rocha em 1959 era um curta-metragem. Acredito que por várias razões, o formato de curta-metragem tenha um caráter fundacional na história do cinema brasileiro e de seu desenvolvimento. O curta, dessa forma, permite uma maior liberdade de experimentação, e tem sido rito de iniciação de grandes diretores, tanto no gênero do documentário como no de ficção: Humberto Mauro, Lima Barreto, Rogério Sganzerla, Alberto Cavalcanti, Jorge Furtado, entre outros...

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Depende do filme... E também porque é ilusão, achar que haverá espaço para tudo em jornais. Penso que a internet é uma excelente ferramenta de pesquisa para quem se interessa pelo formato de curta-metragem, produzido no Brasil e no mundo. Raramente leio uma crítica séria em jornal. É importante não confundir análise critica de um filme e seus elementos constitutivos, com resenhas e entrevistas com diretores, que é o que você comumente encontra nos jornais e na mídia em geral.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Não há fórmulas, há filmes. Eu trabalho com vídeos e filmes Super 8. Sei o que é público, mas não sei o que é “mais público”. Isto é um assunto da esfera de política cultural ligada ao cinema.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
Eu não vejo a dicotomia entre longa e curta-metragem. Interesso-me pela linguagem áudio-visual em si mesma, seja lá em qual for o formato que ela se manifeste.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Atualmente realizo três diferentes documentários em curtas-metragens sobre artistas plásticos. Os vídeos estão sendo produzidos em associação com a Galeria Artur Fidalgo no Rio de Janeiro e serão lançados no segundo semestre de 2010.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Como dizia meu amigo Rogério Sganzerla: “há cineastas e há cineastas”.

sábado, 7 de maio de 2011

Ruth Albuquerque



Ruth é Superintendente de Registro da Ancine (Agência Nacional do Cinema).

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
O curta-metragem foi um meio do jovem, ou do aspirante a cineasta, apresentar seus primeiros trabalhos. E também o de exercitar novas linguagens. Isso não significa que é mais fácil fazer um curta. Mas sim que o investimento na produção pode ser bem menor do que o exigido para um longa-metragem. O que permite o aprendizado e a dominação da linguagem e técnicas do audiovisual para um número maior de pessoas, do que seria possível se todos dependessem de um longa para dar início a suas carreiras profissionais.
E isso se dá em todos os países, não apenas no Brasil.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Atualmente esse cenário já sofreu alguma alteração. A própria televisão iniciou uma transformação de comportamento em relação ao curta. E os festivais também contribuíram para uma visão mais correta sobre a importância dessas obras de menor duração. Temos, agora, espaços, críticos e mídia especializados dedicados aos curtas. E esses curtas não são apenas os chamados "filmes", mas abrangem "vídeos" e assemelhados, graças às novas tecnologias. Por outro lado, não podemos desconhecer o fato de que os jornais e os críticos são centrados nos elementos de maior peso na economia esse comportamento exclui, também, muitas obras de longa-metragem, que são o filão comercial da atividade exibidora.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
A televisão e a internet me parecem os veículos de maior sensibilidade para a exibição de curtas. O próprio dinamismo exigido pelo público desses dois veículos melhor se coaduna com o curta-metragem, com a diversidade dos temas, linguagens e técnicas dessas obras.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
Técnica e artisticamente sim, pois pode ser uma opção do cineasta. Mas economicamente é inviável, não se torna fonte de sustento profissional. O que, aliás, é bem difícil, mesmo com os longa-metragens, pela atual situação do mercado.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Não é marginalizado, absolutamente. Apensas é encarado como uma obra que sofre maiores dificuldades de acesso ao mercado.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Não sou diretora, apenas produtora. Mas penso, regularmente, em histórias que dariam curtas bem atraentes. E sou fã dos curtas. Temos obras belíssimas, de diferentes temas, estilos e técnicas.

R.F.Lucchetti


EXPERIÊNCIAS EM RIBEIRÃO

Rubens Francisco Lucchetti

O cinema sem câmera nasceu em 1935 com o filme Cllour-Box de autoria de Len Lye, um pintor nascido na Nova Zelândia. É Cavalcanti que nos narra como tudo aconteceu: “... Recordo-me perfeitamente de quando Len Lye nos procurou para dizer que queria fazer um filme sem câmera. Foi preciso muita persuasão, muito“charme” pessoal de sua parte que o ouvíssemos até o fim. Mas ao terminar sua explicação, Grierson e eu estávamos convencidos de que ele faria. Grierson percebeu logo as possibilidades publicitárias do empreendimento e não deixou fugir a “chance”. Além do mais, a explicação de Len Lye fazia tudo parecer coisa muito simples”.

No Brasil são poucos conhecidos esses filmes para não dizer que são totalmente ignorados. Ouros nomes se alinharam ao de Len Lye na produção de filmes desenhados diretamente na película cinematográfica. Podemos citar Norman McLaren, mais conhecido entre nós, e que, segundo Cavalcanti, é um mero imitador de Len Lye.

Se essa modalidade de cinema é pouco difundida em todo o mundo, havendo pouco mais de uma dúzia de pessoas que ele se dedica, conhecemos em nosso país apenas um discípulo de McLaren: Roberto Miller, jovem publicitário paulista que embora quase desconhecido entre nós, tem várias películas premiadas em festivais internacionais e viu um dos seus trabalhos, Sound Synthetic, incluído no Festival “10 anos de filmes sobre arte” que o Museu de Arte Moderna realizou em São Paulo m 1955.

Embora tudo isso existisse, eu ignorava completamente esse cinema, tendo conhecimento somente através de livros e revistas especializadas.

“Descobri” o cinema abstrato, quando, em junho de 1960 o Clube de Cinema de Ribeirão Preto organizou, em colaboração com o Centro dos Cine-Clubes, uma sessão dedicada ao Cinema Experimental e Filme sobre Arte. Nessa noite foram exibidos alguns filmes de Norman McLaren, que chocou a alguns e maravilhou a todos. Como explicá-los? Impossível. Esse tipo de cinema não é para se “explicar” mas para “sentir”.

Desde há muito eu vinha procurando um meio de expressão que me satisfizesse plenamente através do qual eu poderia dar vazão a um novo sentido de arte: interpretar por meio de formas a música, dar movimento a um quadro abstrato ou simplesmente movimentar fantasias de “arabescos’, ‘turbilhões’ de formas, sons e cores. Tudo isso eu imaginava, “sentia” mas não conhecia e fui descobri-lo com trinta anos, com mais de dez anos de atraso, naquela memorável ocasião em que desfilaram diante dos meus olhos Stars and Stripes, Hoppity Pop, A Little Phantasy e Two Bagatelles. Para mim, estava descoberto McLaren, estava descoberto o “cinema sem câmera” – um mundo novo de formas e cores em movimento.

Os filmes interessaram a um grupo de estudantes da Escola de Artes Plásticas de Ribeirão Preto, liderados pelo escultor e cenógrafo Bassano Vaccarini, cujo entusiasmo chegou a tal ponto que o levou a fundar na Escola de Artes Plásticas, um Centro Experimental de Cinema.

Porém, os primeiros entusiasmos se foram apagando, as aulas e os problemas cotidianos foram suplantando a idéia e o número de interessados foi decrescendo até ficarem somente eu e Bassano Vaccarini.

Devido ao alto custo do filme virgem, utilizou-se de uma velha película de 16mm já usadas e sem nenhum valor. Foram gastas 6 horas para livrá-la da camada gelatinosa. No dia seguinte entregava a metade da película a Vaccarini e passei a me utilizar do restante. Pusemo-nos a trabalhar pela noite adentro e, após vários dias, estavam prontos os primeiros cem pés. Incrédulos de um resultado positivo, colocamos o filme no projetor. O momento era de “suspense”. Somente eu e ele. Apagamos a luz e fizemos o projetor funcionar. A emoção foi enorme: permanecemos calados, incrédulos do que víamos.

Meses mais tarde, tínhamos concluído o primeiro filme: Abstrações, que reúne quatro “estudos”, com a duração total de 17 minutos. Depois de concluído o “desenho” deparamos com o problema de sonorização, e que foi satisfatoriamente resolvido com a gravação em fita magnética por Milton Rodrigues, sonoplastia da PRA 7, emissora local e que já traz consigo alguma experiência, pois durante anos foi o responsável pela sonoplastia de jornais cinematográficos e até de alguns filmes de longa metragem.

O ideal seria a transplantação para a “banda sonora” do filme e copiar o que havíamos feito. Mas dado o alto custo, o filme permanece no original e a cada projeção vai se deteriorando. Acredito mesmo que não alcançará mais que uma meia dúzia de projeções pois a tinta (nanquim comum) está se desfazendo.

Estamos estudando um novo filme abstrato que terá o título de ‘Arabescos’, cujo material estamos preparando e esperamos terminá-lo no primeiro semestre de 1961.

Entretanto não é somente o cinema abstrato que tem sido alvo de nossa atenção. Também o de câmera proporciona excelente campo para o filme experimental. Estamos na fase de conclusão do primeiro que se intitula ‘Fantasmagorias’: é a movimentação de uma fantástica paisagem noturna que é mostrada ao espectador com ligeiras tomadas de grandes planos, planos de conjunto e panorâmicas. De repente começa a aparecer no filme uma série de coisas extraordinárias, como a materialização de um fantasma sobre o pântano, outro que sai do interior de um vaso e retorna ao mesmo, materialização de dois estranhos pássaros que são desintegrados por misteriosas explosões, enfim, toda uma série de fatos fantásticos acontece sobre a paisagem, até que clareia o dia e tudo volta à tranqüilidade.

Para os movimentos utilizamos folhas de cartolina preta na qual estão desenhadas as figuras, estes cartões são filmados de um a um (volta da manivela) e depois de todos filmados, voltamos o filme e filmamos o quadro, devendo sobrepor a figura anteriormente filmada exatamente nos seus respectivos lugares.

‘A Sombra’ é um novo filme em fase de acabamento baseado num conto homônimo de Edgar Allan Poe. O filme está dividido em duas partes: a primeira, representando a cidade de Ptolemais com suas ruas desertas e melancólicas; a segunda, a sala onde se desenrolará a trama. Tudo isso será feito sem nenhum movimento das figuras e sim da câmera cinematografia. Para não se cair na monotonia, tudo deverá ser feito de tal maneira que o espectador tenha a impressão de ver uma história “movimentada” quando na realidade é apenas composição de quadros estáticos.

Sobre cinema com câmera há ainda mais dois projetos para filmes, que deverão ser produzidos em janeiro de 1961.

O primeiro Tourbillon, é a movimentação de chenille, pelo processo já citado da “volta da manivela”, ou seja, para cada movimento feito nos fios de chenille, dá-se uma volta na manivela da câmera.

O segundo Cosmos, que deverá, que deverá ser feito por processo inteiramente diferente dos demais, será, uma concepção abstrata da formação do cosmos.
Todos os empreendimentos do Centro Experimental de Cinema têm sido feitos com os meus próprios recursos financeiros, daí, uma simples produção como ‘Fantasmagorias’ que poderia ser feita em pouco mais de uma semana (caso recebêssemos auxilio do governo) levou mais de seis meses para ser concluída. Assim mesmo, dado ao alto custo das cópias e “mixagens”, conservamos o próprio original e a gravação é feita em fita magnética.

Texto publicado no jornal O Estado de S.Paulo – suplemento literário – Sábado, 25/02/1961.

domingo, 1 de maio de 2011

Ruy Gardnier



É jornalista e editor da revista eletrônica Contracampo, ex-professor de linguagem cinematográfica na Escola de Cinema Darcy Ribeiro, crítico de cinema de O Globo e colaborador da revista Paisà, além de atuar como pesquisador de cinema, cineclubista e curador de mostras de cinema.

Qual é a importância histórica que o curta-metragem tem no cinema brasileiro?
Se você pensar que a filmografia brasileira tem entre seus grandes filmes ‘Di Cavancanti’ do Glauber Rocha, ‘Zezero’ de Ozualdo Candeias, ‘Superoutro’ do Edgard Navarro, ‘Ilha das Flores’ de Jorge Furtado, ‘Pixinguinha’ de João Carlos Horta, ‘Tesouro da Juventude’ e ‘Vocês’ de Arthur Omar, ‘Eu Sou Vida Eu Não Sou Morte’ de Haroldo Marinho Barbosa, ‘Partido Alto’ e ‘Nelson Cavaquinho’ de Leon Hirszman, entre muitos outros, você nota rapidamente a relevância artística do formato. Podemos analisar a importância histórica através de dois fatores, a) as grandes obras em curta-metragem deixadas à posteridade e b) a prática do curta-metragem dentro da economia do cinema brasileiro. No segundo aspecto, que se mantém mais ou menos desde os anos 50, o curta-metragem é visto como porta de acesso ao longa-metragem, e freqüentemente o diretor que filma seu primeiro longa jamais voltará ao curta-metragem, a não ser por questões de necessidade (ou seja, por não conseguir recursos para novos projetos de longa). O curta-metragem tem essa reputação de espaço da juventude, da experimentação, mas há muito tempo isso não se confirma quando vemos grande parte dos filmes: muitos dos novos cineastas pensam seus filmes como portfólios para impulsionar seus futuros projetos, seguindo, como é de se esperar, a ideologia dominante e a mentalidade corporativa/publicitária. Em todo caso grandes filmes continuam sendo feitos no formato de curta-metragem. Eu destacaria na última década o Kleber Mendonça Filho, de Recife, e o mineiro Marcellvs L., que hoje circula mais no circuito de artes plásticas do que no de cinema.

Dentro da economia do cinema brasileiro, concede-se ao curta um espaço e uma relevância subalterna. Alguns realizadores, no entanto, subvertem a expectativa e criam algumas das maiores jóias do cinema feito no país.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Porque o curta-metragem não é um formato tradicional de exploração comercial. Nunca se estabeleceu um circuito para curtas-metragens, e eles têm muito pouca visibilidade sendo exibidos apenas em festivais de cinema. Os jornais trabalham com uma ideia de fato jornalístico em que dificilmente o curta-metragem se inscreve, a não ser quando ganha prêmio em algum festival estrangeiro. Antes, ao menos, havia o espaço do especialista, a coluna do crítico que minimizava essa lógica e chamava atenção para bons filmes, curtas ou não, que estavam fora do circuito exibidor (ou seja, a programação de cineclubes, cinematecas e centros culturais).

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Não sei. Sou contra a imposição de curtas-metragens nas sessões regulares de circuito comercial. É claro que seria interessante se os curtas-metragens tivessem maior visibilidade, mas quando até as sessões gratuitas com curtas-metragens (digamos, o programa Petrobras às Seis) têm pouco público, o que fazer? Em todo caso, acho que os programas de disponibilização de curtas na internet (apesar das precariedades de ver filmes por streaming, numa telinha pequena, com vídeo e áudio no máximo aceitáveis) e os esforços da Programadora Brasil notáveis no sentido de fazer circular e tornar visíveis os curtas-metragens.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
Comercialmente é inviável. Mas há uma infinidade de realizadores que, por razões estéticas e/ou econômicas, fazem carreira no curta-metragem, como Don Hertzfeldt, Stan Brakhage, Peter Tscherkassky, entre muitos outros. Note-se que para eles não importa fazer "curta-metragem". O que importa é o tamanho que o projeto tem.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
O formato comercial é o longa-metragem. O que marginaliza o curta não são os cineastas, os produtores, o circuito exibidor, nada disso. É a lógica de um sistema. E sistemas não se mudam assim, da noite pro dia. A boa notícia é que grandes filmes podem surgir em qualquer formato independente de qualquer lógica de mercado ou de sistema.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Não.