sexta-feira, 17 de maio de 2013

R.F.Lucchetti: Memória Cinematográfica


HOLLYWOOD PERDEU O GLAMOUR
Rubens Francisco Lucchetti

Para mim, o Cinema termina quando entra a tecnologia em demasia. Então, a criatividade deixa de existir; e ficam apenas cenas vazias, cheias de efeitos especiais criados por máquinas. Na época em que não havia toda a tecnologia de que dispõe atualmente, Hollywood era a “usina de sonhos” que encantava o mundo. Com o aperfeiçoamento da tecnologia, essa “usina de sonhos” deixou de existir. Em suma: a tecnologia tirou a alma do Cinema. Para comprovarmos isso, basta que rememoremos os filmes produzidos nos Estados Unidos nos últimos dez anos, será que vamos encontrar dez que mereçam ser vistos uma segunda vez? Duvido.

Na atualidade, os filmes norte-americanos são um desfile de correrias, cenas de luta, perseguições, explosões, sangue em excesso... E, acima de tudo, um cortejo de péssimos intérpretes. Na verdade, os bons atores praticamente desapareceram; e as atrizes, em sua maioria, não têm talento algum.

Para ser sincero, as atrizes de hoje, com raras exceções, não são nem exemplos de beleza. Falta-lhes algo fundamental: glamour. É como disse Rubens Ewald Filho, numa crônica (*) que li há alguns anos: “Faz tempo que perdi a ilusão de que ainda existe glamour em Hollywood.”

Não há termos de comparação entre as atrizes do passado e as do presente. Alguma atriz atual tem a ambigüidade de uma Lauren Bacall ou de uma Veronica Lake? A classe de uma Joan Fontaine ou de uma Olivia de Havilland? A espontaneidade de uma Doris Day? A expressão de uma Ingrid Bergman ou de uma Vivien Leigh? A exuberância de uma Jane Russell? A graciosidade de uma Audrey Hepburn ou de uma Priscilla Lane? A impetuosidade de Maureen O’Hara? A ingenuidade de uma Coleen Gray ou de uma Debbie Reynolds? A sensualidade de uma Kim Novak ou de uma Marilyn Monroe? A serenidade de uma Gail Russell ou de uma Merle Oberon? A vivacidade de uma Lana Turner? A voluptuosidade de uma Marlene Dietrich ou de uma Rhonda Fleming? O charme de uma Rita Hayworth? O encanto de uma Deborah Kerr? O impacto de uma Paulette Goddard? O porte de uma Grace Kelly? O romantismo de uma Donna Reed ou de uma Linda Darnell? Atualmente, que atriz tem o magnetismo de Louise Brooks, a célebre Lulu de A Caixa de Pandora?

Uma das poucas atrizes norte-americanas que tem o glamour das estrelas do passado é Sharon Stone. E cheguei a essa conclusão após ouvir a professora universitária e ensaísta Camille Paglia afirmar, durante uma entrevista num programa de televisão, que “Sharon Stone restituiu o brilho da antiga Hollywood”. A partir desse dia, comecei a reparar em sua interpretação nos mais diversos filmes (As Minas do Rei Salomão, Enigma do Passado, Instinto Selvagem, Invasão de Privacidade, Diabolique e, entre outros, Glória). A tela ilumina-se sempre que ela entra em cena. Talvez seja uma das únicas atrizes da atualidade que pode ser comparada, por exemplo, a Ava Gardner (no começo dos anos 1990, chegaram a afirmar que Sherilyn Fenn, revelada por David Lynch no seriado Twin Peaks, seria a nova Ava Gardner; porém, a atriz não teve fôlego e hoje está praticamente esquecida), Barbara Stanwyck, Elizabeth Taylor, Hedy Lamarr, Jennifer Jones, Lee Remick e Lizabeth Scott.

Bem, neste instante, alguém pode estar perguntando: “E Julia Roberts? E Michelle Pfeiffer? Não têm glamour? Não são tão talentosas quanto Sharon Stone?”

Eu até diria que são mais talentosas que Sharon Stone (basta ver Julia Roberts em Uma Linda Mulher, Dormindo com o Inimigo, O Segredo de Mary Reilly e Closer – Perto Demais; e Michelle Pfeiffer em Um Romance Muito Perigoso, Ladyhawke – O Feitiço de Áquila, De Caso com a Máfia, Lobo e Revelação) e têm uma carreira mais consistente. No entanto, não possuem o mesmo glamour de Sharon Stone.

Há ainda em Hollywood algumas atrizes bastante talentosas: Andie MacDowell, Demi Moore, Geena Davis, Jessica Lange, Jodie Foster, Meryl Streep, Nicole Kidman... Mas, em minha opinião, são destituídas de glamour.

Há também duas atrizes que “incendiaram” as telas cinematográficas na década de 1980: Kathleen Turner e Kim Basinger, que estrelaram, respectivamente, Corpos Ardentes e 9 ½ Semanas de Amor. Entretanto, não são tão glamourosas quanto Sharon Stone; e faz tempo que suas “chamas” se extinguiram.

Por outro lado, existem também algumas atrizes – não são muitas – que, apesar de serem talentosas e terem glamour, não são bem aproveitadas pelos diretores e produtores.

Uma delas é Theresa Russell, que, em 34 anos de carreira (ela estreou no Cinema em 1976, na fita O Último Magnata, dirigida por Elia Kazan), pôde realmente mostrar sua beleza, sua sensualidade, seu charme e seu talento para interpretar em pouquíssimos filmes (O Mistério da Viúva Negra e Tentação Perigosa são dois deles). Portanto, Theresa Russell é a prova de que, para vencer no mundo cinematográfico, não basta a atriz ter beleza, talento, glamour... é preciso que ela tenha também (e principalmente) sorte.

NOTA:
(*) Essa crônica foi publicada em novembro de 2000, no número 11 da revista Sci-Fi News Cinema.