sábado, 20 de setembro de 2014

Raul Arthuso


Cineasta e editor. É dele o curta-metragem “Master Blaster – Uma aventura de Hans Lucas na Nebulosa 2907N”.

O que te faz aceitar participar de produções em curta-metragem?
A grande parte dos curtas-metragens em que trabalhei foram dirigidos por amigos que conheci durante a faculdade na USP. Então, eu diria que a primeira razão é a afinidade com as pessoas envolvidas. Porém, há também outros aspectos, como o dinheiro. Não que a produção de curta-metragem pague muito bem, mas já trabalhei na equipe de som direto de alguns filmes para ajuda no orçamento do mês, ainda que eu não conhecesse grande parte da equipe.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
A principal razão está clara: o curta não é exibido em circuito comercial e os meios impressos tomam a agenda das salas como referência para suas pautas. Algumas revistas eletrônicas como a Cinética e a Filmes Polvo dão destaque com textos para os curtas em suas coberturas de festivais. Mas a crítica semanal nunca fala de curtas-metragens porque são obras restritas ao circuito de festival. E a mídia segue o dinheiro...

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
A lei que obriga a exibição de um curta antes de qualquer longa projetado em sala comercial caiu em desuso. Existe, mas ninguém faz. Tentar colocá-la em prática não parece tão viável mais, pelo menos não em tempos de salas de shopping. O Espaço Unibanco em São Paulo fazia eventualmente uma sessão de curtas no horário das seis da tarde. Iniciativas como essa são escassas mas uma via interessante de acostumar o público. A questão é como popularizar o espectador com a idéia de ver um curta. Um espaço interessante para conseguir mais difusão seria a TV, pela duração que permite maleabilidade às emissoras. Talvez fosse o caso de uma política visando esse intercâmbio entre o curta e a TV. Mas o grande meio hoje, ainda pouco explorado pelos produtores ao meu ver, é a internet. Parece a alternativa pra um formato que, por razões mercadológicas, tornou-se alternativo.

É possível ser um cineasta só de curta-metragem? Vemos que o curta é sempre um trampolim para fazer um longa...
No cinema tudo é possível. Claro que o formato consagrado pela grande indústria e o cinema de arte é o longa. Mas é possível construir uma identidade só pelo curta, como o Eduardo Valente e o Kleber Mendonça Filho. Este último, por exemplo, vai estrear em longa após uma bela carreira em curta, que o consagrou como cineasta com adoração crítica, participação em festivais importantes e diversos prêmios. Mas o mais importante é que seus curtas não são meros aprendizados para um possível longa: seus filmes são explorações interessantes das possibilidades narrativas do formato. Sua estréia em longa m parece mais uma necessidade de contar uma história maior do que o desembocar de uma série de curtas. Outro fator complicador é a profissão: se já é difícil sobreviver financeiramente no Brasil como diretor de longas-metragens, apenas com curtas é quase inviável, se você não tiver outra forma de sustento. Isso de alguma maneira se impõe certa hora.

O curta-metragem é marginalizado entre os próprios cineastas?
Não sei se isso acontece. Pode ser que já tenha acontecido, hoje não vejo. Há o caso interessante da turma da “Alumbramento” que apesar de já realizar longas sempre se volta para o curta-metragem, assim como o faz também o Cao Guimarães. O curta-metragem foi muito importante nos anos 90, antes da retomada e eu arriscaria dizer que muito do que de mais interessante aconteceu no cinema brasileiro nos ano 2000 foi na produção de curta. O que acontece, de fato, é que a restrição à exibição dos curtas ao circuito de festivais impede muitas vezes que quem não participa desses eventos veja os filmes. Assim, me parece que depois que um cineasta deixa de fazer curtas, ele dificilmente vê curtas se não por acaso ou se o diretor bater na porta do cara e der uma cópia pra ele (às vezes nem assim). Mas entre os diretores mais novos, acredito que nenhum tenha qualquer questão em realizar um novo curta, mesmo depois estrear em longas-metragens.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Já dirigi dois curtas durante a faculdade e tenho idéias de curtas que desejo realizar. Acho importante ter em mente tentar realizar algo que explore o formato e fuja de ser um “longuinha”.