sexta-feira, 8 de maio de 2015

Fernanda Chicolet


Atriz e roteirista. No cinema atuou em “Linha de Fuga”; “Mata Hari”; “Colostro” (curta-metragem); entre outros.

O que te faz aceitar participar de produções em curta-metragem?
O roteiro! Nada me deixa mais feliz do que ter em mãos um projeto com vigor, com personagens que me surpreendam, histórias com inteligência e sem truques.

Conte sobre a sua experiência em trabalhar em produções em curta-metragem.
Fiz Artes Cênicas, na USP, fiquei muito tempo só envolvida com o teatro, mas já na faculdade comecei a participar de alguns projetos em cinema e me encantei. A câmera parece conseguir ler cada filigrana do pensamento do ator, me senti desafiada. A ponto de, em dado momento, começar a escrever, para não parar de fazer, para que não dependesse apenas de convites. Foi uma redescoberta como artista, no sentido de que eu poderia criar personagens e histórias que tivesse vontade de viver e contar. Acho que minha formação como atriz me ajudou a escrever, de certo modo comecei a construir atmosferas e diálogos baseados no que meu corpo já havia vivido no palco, a partir da minha intimidade com as personagens. E o processo como roteirista também me ajudou como atriz, minha escrita é lenta, faço muitos tratamentos nos meus roteiros, então sinto que quando vou fisicalizar a personagem já a conheço bem, porque tive todo esse tempo de convivência e assimilação. O passo seguinte foi abrir uma produtora de cinema, a Arte In Vitro Filmes, junto com o Cainan Baladez, que é diretor e parceiro nesses projetos em que escrevo, atuo e, às vezes, dirijo. Enfim, adoro receber convites de bons cineastas, com boas personagens, mas é libertador saber que não dependo só deles para seguir com meu trabalho.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Talvez por não serem comercializados e não terem um espaço de exibição na programação dos cinemas. Mas existem festivais de curtas metragens incríveis no Brasil, que preenchem um pouco esses espaços, onde você pode acompanhar o que existe de melhor sendo feito no país e no exterior. Além de ser uma ótima oportunidade de troca entre cineastas de vários lugares. E não sinto que só o curta-metragem sofra com a falta de espaço. Acho perverso, por exemplo, o que acontece com os longas que entram em cartaz (muitas vezes depois de anos de tentativas) e precisam fazer um público bom na primeira semana, do contrário já ficam limitados a horários e salas de difícil acesso. Acho que as políticas de distribuição e exibição precisam ser debatidas e reajustadas ainda, para que exista um maior equilíbrio de forças no mercado, entre produtores, artistas, distribuidores, exibidores, público e poder público.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Eu acredito muito na volta da lei de exibição de curtas antes dos longas. Reestruturada, com curadores que selecionem bons curtas e curtas que dialoguem com os longas que serão exibidos na sequência. E acho também que a nova lei para TV paga pode ser fundamental para expandir e difundir o curta-metragem na televisão brasileira, pode abrir um espaço importante para intensificar o diálogo do formato com o público.

O curta-metragem para um profissional (seja ele da atuação, direção ou produção) é o grande campo de liberdade para experimentação?
Sinto que a experimentação e o risco deveriam ser inerentes ao fazer artístico, de modo geral. No caso dos curtas, tenho tido a oportunidade de ver muitos trabalhos inovadores e contundentes nesses festivais em que frequento, de cineastas que estão despontando por aí, fazendo seus filmes com ou sem patrocínio, mas com bastante vigor. Mas acho que para atingir essa qualidade, é importante que se busque um olhar pragmático para o próprio trabalho, a telona é muito sedutora, tanto para o ator, quanto para o diretor, acho que a gente deve tomar cuidado pra não se encantar com a própria imagem, sabe? Isso pode comprometer bastante o resultado de um filme. Nessa hora é fundamental ter amigos talentosos e sinceros, que te ajudem a enxergar seu projeto sem firulas.

O curta-metragem é um trampolim para fazer um longa?
É uma ótima pergunta, porque persiste uma crença de que o curta é só um “aquecer de tambores” para o longa, né? Eu não sinto assim, nunca criei nenhum trabalho pelo tempo, são as histórias que me dizem quanto tempo elas tem. Não acho que o curta-metragem é um formato inferior ao longa, acredito que o tamanho do projeto é determinado pelo que se quer contar. Inclusive já tive muito a sensação de assistir a curtas que sentia que não cabiam naquele formato, assim como vi longas que, suspeito, ficariam melhores se tivessem sido pensados como curtas. Eu mesma, por exemplo, comecei a escrever um roteiro de curta-metragem e, lá pelo sexto tratamento, me dei conta de que aquela história não cabia no formato, de que era, na verdade, um roteiro de longa-metragem.

Qual é a receita para vencer no audiovisual brasileiro?
Hum… essa ideia de vencer é muito relativa, né? Vencer para quem? Para o público? Para a crítica? Para o seu próprio critério? Acho que o cineasta tem que buscar clareza nos seus objetivos e perseguir isso de forma coerente e honesta. O mais importante é que, cada um do seu jeito, tenha apoio de políticas públicas que permitam que essa diversidade aconteça de forma equilibrada. Existem diversos tipos de cinema sendo feitos no Brasil, para cada um desses jeitos vencer tem um significado diferente.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Sim, tenho a minha gavetinha de roteiros. E o que comentei antes tem muito significado para mim, adoro essa independência de produzir meus próprios projetos, de não ser mais uma atriz a procura de um papel, isso me angustiava bastante antes de começar a escrever. Então tento abrir outras frentes, me desdobrando nas funções de direção e produção para poder esvaziar a tal gavetinha de roteiros e de personagens. Embora me sinta mais a vontade como atriz e roteirista, tive uma experiência bem legal como diretora no Animador, primeiro curta que assino a direção, junto com o Cainan. Agora estamos finalizando nosso próximo projeto, o Colostro, em que dividimos o roteiro, Cainan assina a direção e eu a co-direção. Acho que sempre optarei por essa direção compartilhada, essa parceria que me permita ser atriz no projeto, porque no set eu gosto mesmo é de atuar.