sábado, 1 de agosto de 2015

Fernando Ghirardelli


Ator. Atuou nos espetáculos “Antídoto para Impossibilidades e Paralisias”; “O Ritual”; entre outros.

O que te faz aceitar participar de produções em curta-metragem?
Interpretação é um ofício, como qualquer outro. Concordo que seja uma área com uma proporção grande de pessoas que amam o que fazem. Mas é trabalho; e o ator, diretor, produtor, são, portanto, trabalhadores. Então, a primeira coisa que a produção de um curta-metragem deve ter para me atrair é essa percepção profissional. O cheiro do profissionalismo é o que me faz sentir à vontade em um ambiente que eu estou chegando para fazer um trabalho.

Eu discordaria, por exemplo, do ator que respondesse, por exemplo, que ficaria atraído pela adequação de pensamento entre o seu próprio e o do projeto a ser feito. O ator pode ou não contribuir com a concepção de um curta, mas ele deve, invariavelmente, contar a história a qual o curta se destina, seja qual for. Esse é o profissionalismo que o ator pode e deve contribuir. O ator que está a serviço do próprio pensamento quer atenção pra si. E estrelato é outra coisa.

Conte sobre a sua experiência em trabalhar em produções em curta-metragem.
Eu tenho pouca experiência com curtas, mas esteja avisado: horas e horas de gravação às vezes rendem poucos segundos de material viável. E como o cinema é uma linguagem que tem chance de corrigir algo que não esteja bom até a perfeição, as expectativas do espectador são altas – menos do que perfeito não vai servir. Então se a atuação, a contra-regragem, a iluminação, (e depois da gravação) a edição, trilha sonora, efeitos especiais etc. (ufa!) não parecem em sincronia para o diretor, o próximo passo, sim, é regravar tudo. Do começo. Então esteja preparado: curta é só pra quem assiste. Pra quem faz, sempre é longa.

Por que os curtas não têm espaço em críticas de jornais e atenção da mídia em geral?
Condicionamento. Eu, quando vejo um filme com menos que uma hora e meia, acho pequeno. Estou acostumado com filmes tão longos que deveriam se chamar “longa-longa-metragens”. E nem sempre esses “longa-longa” conseguem me atravessar como público. Talvez eles ainda precisassem ser “longa-longa-longa-metragens” para conseguir atingir algum público. Cada vez precisamos de mais tempo para falar, achamos nossos argumentos tão importantes. Esse é desafio do curta, imagino. Ser sintético, ao mesmo tempo em que se é argumentativo e coeso.

Na sua opinião, como deveria ser a exibição dos curtas para atingir mais público?
Vale repetir o clichê da Internet? Se achamos um lugar que aceita comunicação em 140 caracteres ou menos, este parece ser o lugar para filmes de curta duração. Mas, como sei menos de Internet do que sei de curtas, acho que podemos também achar em Marketing a resposta pra isso. Há na propaganda televisiva uma função semi-educativa involuntária: enquanto você aguarda o retorno da programação que está assistindo, seu cérebro está sendo influenciado sem que saiba. Ou seja, no teatro, é como ter um entremez no intervalo do primeiro e do segundo ato de algum drama. Há uma estratégia nisso: Martins Pena escreveu pequenas comédias que eram apresentadas nos entreatos de uma peça principal, até que suas comédias se tornaram as peças principais. É um pouco da resposta acima, precisamos condicionar o público pra assistir curtas, e porque não utilizar como muletas as linguagens que já têm público garantido?

O curta-metragem para um profissional (seja ele da atuação, direção ou produção) é o grande campo de liberdade para experimentação?
Em última instância, a Arte é um campo de liberdade para experimentação. Não podemos esquecer esse dado. Contudo, curta ou longa, filmes são entretenimento – não podemos esquecer isso também. E entretenimento depende diretamente do público. Ou seja, não sei se pode haver independência dessa forma. “Experimentar” (e eventualmente revolucionar) tem a ver com estar na berlinda, em risco. Se existe “liberdade” para experimentar, isso não é se colocar em risco. Um parece contrapor o outro. Logo, se, ao fazer curtas com experimentação, há o risco de fracasso total, em grandes escalas, isso me parece um balanço positivo – podemos ganhar tanto quanto perder público. Se, ao fazer curtas com experimentação, há esse conforto de ser livre para fazer isso, pode ser que não há risco porque não há público para perder, o que significa que não há nada.

O curta-metragem é um trampolim para fazer um longa?
Cada aventura é uma aventura. É currículo (ou slogan) quando o James Cameron usa “do diretor de Titanic” para a sua nova direção, “Avatar”? Além de ser capturados pela lente, o que esses filmes têm em comum, para que um justifique o outro? Cada aventura é uma aventura.

Qual é a receita para vencer no audiovisual brasileiro?
Tenho menos de 30 anos. Quem sou eu pra falar de fazer coisas que pessoas melhores que eu ainda não fizeram? Apesar disso, particularmente, eu dispenso receitas para vencer. Fórmula eu uso em matemática, ou seja, Exatas. Em Humanas, em se tratando de gente... Há tanta gente nesse país, como colocar todo mundo em um grupo só? Acho que a melhor receita deve ser essa: acrescente todo mundo numa panela só e espere queimar. Nacionalidade é um conceito muito tênue. E vencer é uma palavra que me lembra de imperativos capitalistas, imperativos de eficácia, não acho tão legal usar na Arte. Então, por “brasileiro” eu vou usar “uma pessoa”. E por “vencer”, eu vou trocar usando “atingir”. Qual é a receita para atingir uma pessoa? Ser honesto. Claro, cada um usar honestidade do seu jeito (uns usam bem, outros mal; uns para o bem, outros pro mal). Mas honestidade é uma coisa legal de usar na Arte.

Pensa em dirigir um curta futuramente?
Se eu tiver necessidade de falar algo, sim. Se o que eu tiver pra falar se adequar a um curta, com certeza. Do contrário, é um desperdício do meu discurso e um insulto a essa linguagem. Ambas as partes saem perdendo com isso.